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v. 2, n. 11, nov. 2024
A importância de protagonistas negros e o papel das bibliotecas escolares na educação antirracista

A importância de protagonistas negros e o papel das bibliotecas escolares na educação antirracista

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A importância de protagonistas negros e o papel das bibliotecas escolares na educação antirracista

Pesquisa da UEL analisa como a literatura infantil com protagonistas negros pode fortalecer a identidade das crianças

Estudo da Universidade Estadual de Londrina (UEL) discutiu a importância de um acervo de obras com temáticas afro-brasileiras e a importância de livros para o processo de formação identitária de crianças negras.

“A literatura infantil e os processos de mediação de obras que fortaleçam as identidades negras e garantam o direito a uma sociedade antirracista têm se tornado uma pauta emergente, sobretudo, em tempos nos quais essas identidades são negadas e o racismo ainda é uma realidade social no Brasil” relata Odilia Fernandes, egressa do curso de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da UEL e autora do estudo.

A violência contra pessoas negras no Brasil tem alcançado números alarmantes. De acordo com o IBGE, a taxa de homicídios foi 16,0 entre as pessoas brancas e 43,4 entre as pretas ou pardas a cada 100 mil habitantes em 2017.

“Como filha de um homem negro, cresci ouvindo as histórias de racismo velado nas conversas dos adultos, as pequenas violências eram narradas, quase que, com pouca indignação, como se os familiares já tivessem se acostumado com a perversidade do racismo nesse país. Diante disso e ciente de que a atuação do bibliotecário é também um ato político e de responsabilidade social, o estudo é um convite à reflexão sobre como é possível fazer reverberar em bibliotecas escolares uma literatura que promova representatividade da população negra”, explicou a pesquisadora.

Crianças e adolescentes negros sofrem  diariamente com racismo em instituições de ensino de todo o país e isso se originou no periodo escravocrata. Segundo dados de 2021 da ONU, entre 25 milhões e 30 milhões de pessoas foram violentamente desenraizadas da África para serem escravizadas. 

As pessoas afrodescendentes em diferentes países pediram pela responsabilização das pessoas culpadas e reparação pelos danos sofridos devido à escravidão, o comércio transatlântico de pessoas africanas escravizadas, o colonialismo e as sucessivas políticas e sistemas racialmente discriminatórios.

No Brasil, o processo de reparação histórica para a população negra avança lentamente. Apesar das políticas públicas afirmativas que visam aumentar a presença de negros no ensino superior e das leis que determinam o ensino de história e cultura afro-brasileira nas escolas, o racismo persiste nas instituições que deveriam garantir direitos de forma igualitária para todos.

A Lei Nº 11.645, de 10 de março de 2008 tornou obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena nas escolas

No entanto, os apelidos e a inferiorização da criança negra permanece uma realidade tanto nas escolas quanto nas bibliotecas escolares. A discussão sobre o racismo nesses ambientes é crucial, tanto para a ciência quanto para a prática profissional

A pesquisa investigou a importância de um acervo diversificado que inclui temáticas afro-brasileiras e destacou a necessidade de mediar esses recursos para garantir o acesso a conteúdos que contribuam para a formação identitária da criança negra. Para isso, foram analisados quatro obras de literatura infantil com protagonistas negros que foram nobilitadas pelos prêmios: Jabuti, Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) e Prêmio Literário Biblioteca Nacional e que foram publicadas após a Lei nº 11.645, de 10 março de 2008.

Ao longo das análises, observou-se que as obras infantis premiadas com protagonistas negros atendem plenamente aos princípios estabelecidos pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Portanto, essas obras são altamente recomendadas para mediação nas bibliotecas escolares.

Além de adquirir conhecimento sobre conceitos como o racismo estrutural, a pesquisa proporcionou o contato com relatos de escritores e escritoras negras sobre suas experiências escolares. Esses relatos permitiram uma compreensão mais profunda de como o racismo se manifesta no cotidiano das instituições de ensino.

Obras analisadas na pesquisa:

Referência da obraPrêmio recebidoAno
JÚNIOR, O. Da minha janela. Rio de Janeiro: Companhia das Letrinhas, 2019.Prêmio Jabuti2020
ALMEIDA, L. C.; PIANA, Christian. Contos de Moçambique. São Paulo: FTD, 2017.Prêmio FNLIJ2018
OLIVEIRA, M. D. L. Hortência das tranças. Belo Horizonte: Abacatte, 2015. Prêmio literário Biblioteca NacionalPrêmio Sylvia Orthof2015
NEVES, A. Obax. São Paulo: Brinque book, 2010.Prêmio Jabuti2011

Investigar a realidade dos estudantes negros no Brasil revelou a urgência de refletir e trabalhar a respeito do racismo com crianças e adolescentes. É fundamental quebrar ciclos de discriminação e violência, e acreditamos que o diálogo e a educação desempenham papéis cruciais nesse processo.

O estudo apresentou que tanto as leituras de textos de autoria negra quanto de autores não negros nos mostraram que limitar a mediação de literatura infantil com protagonistas negros a datas comemorativas é extremamente restritivo. É essencial que esses protagonistas estejam presentes ao longo de todo o ano nas instituições de ensino e culturais, de modo a enriquecer o imaginário das crianças com personagens negros e ampliar seu repertório sobre a vida em sociedade. Essa abordagem contínua contribui para a formação de um repertório plural e antirracista.

Capa do livro infantil: “Hortência das tranças” de Lelis
Capa do livro infantil: “Da minha janela” de Otávio Júnior

Dessa forma, é preciso integrar o conhecimento adquirido na pesquisa com nossa prática profissional em bibliotecas escolares, alinhando-o à teoria sobre racismo e literatura infantil. Apesar de a literatura infantil estar presente em nossas mãos diariamente, ainda existem muitas desmistificações necessárias em relação à sua função na formação de leitores. Muitas vezes, essa literatura é vista como meramente utilitária, como um instrumento para ensinar algo específico, em vez de ser reconhecida também como uma porta de acesso ao deleite e ao prazer literário.

Um aspecto da pesquisa foi a elaboração de um instrumento pedagógico para promover a interatividade na biblioteca escolar. O objetivo foi garantir que o texto literário não fosse apenas um pretexto, mas sim uma porta para o autoconhecimento e o entendimento do outro. Espera-se que esse instrumento inspire outras atividades nas bibliotecas escolares, atingindo seu propósito.

Capa do livro infantil: “Contos de Moçambique” de Luana Almeida e Christian Piana

Embora a pesquisa seja uma das poucas nessa área, ela visa motivar outros a explorar a literatura infantil com protagonistas negros e suas possibilidades de mediação para uma educação antirracista. É fundamental que a abordagem do racismo envolva não apenas os movimentos negros, mas também os profissionais da educação, como bibliotecários.

A Lei nº 11.645, de 2008, que estabelece a obrigatoriedade do ensino de história e cultura indígena e afro-brasileira, completa 15 anos em 2023. A prática nas bibliotecas escolares deve refletir a necessidade de promover uma educação étnico-racial e fomentar ações para a desconstrução do racismo.

“Nesta pesquisa, focamos na análise de obras da literatura infantil com protagonistas negros. No entanto, reconhecemos a importância de investigar outras formas culturais e artísticas. Acreditamos que a continuidade das pesquisas focadas nas bibliotecas escolares e, de forma geral, nas escolas, contribuirá significativamente para o desenvolvimento de uma educação antirracista”, afirmou Odilia.

Acesse a dissertação em:

FERNANDES, Odilia Barbosa Ribeiro. Mediação da literatura infantil com protagonistas negros na biblioteca escolar. 2023. 119 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2022. Disponível em: https://repositorio.uel.br/handle/123456789/17712  . Acesso em: 02 nov. 2024.


Redação: Vanessa Forte

Revisão: Pedro Ivo Silveira Andretta

Diagramação: Naiara Raissa da Silva Passos

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