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v. 2, n. 7, jul. 2024
Entrevista com Jacquelin Teresa Camperos Reyes sobre sua pesquisa que analisou o potencial aproveitamento de dados de governo por pequenos e médios produtores rurais

Entrevista com Jacquelin Teresa Camperos Reyes sobre sua pesquisa que analisou o potencial aproveitamento de dados de governo por pequenos e médios produtores rurais

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Entrevista com Jacquelin Teresa Camperos Reyes sobre sua pesquisa que analisou o potencial aproveitamento de dados de governo por  pequenos e médios produtores rurais

Jacquelin Teresa Camperos Reyes

jacquelin@ufpa.br

Sobre a entrevistada

A professora universitária Jacquelin Teresa Camperos Reyes defendeu, em 2023, sua tese de doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Estadual Paulista, campus Marília, sob orientação do Prof. Dr. Ricardo Cesar Gonçalves Sant’Ana

Natural de Cúcuta, Norte de Santander, na Colômbia, Jacquelin é cidadã brasileira desde 2023. Casada há 23 anos com Cesar, é mãe de Maria Juliana e Juan Diego. Seus hobbies favoritos são: viajar, observar a natureza, escutar música, ler e fazer crochê. No âmbito profissional, Jacquelin é professora junto à Faculdade de Biblioteconomia da Universidade Federal do Pará.

Sua tese, intitulada “Aderência Lexical a dados publicados para produtores rurais”, apresentou um marco para analisar o potencial aproveitamento de dados de governo por parte de pequenos e médios produtores rurais, levando em consideração suas necessidades informacionais, tudo isto usando como medida a aderência lexical entre dados publicados e notícias publicadas para esse grupo de usuários.

Nesta entrevista, Jacquelin nos conta sobre sua experiência no programa de doutorado, bem como se deu o desenvolvimento de sua pesquisa.

Divulga-CI: O que te levou a fazer o doutorado e o que te inspirou na escolha do tema da tese?

Jacquelin Reyes (JR): Sempre gostei de estudar e de pesquisar, informalmente, sobre quaisquer assuntos, era um gosto desde minha infância, então era um projeto que se acoplava bem à minha personalidade. Antes de vir para o Brasil, já tinha clara a minha vocação pela docência, de forma que durante a finalização do mestrado comecei a ponderar dar continuidade à vida acadêmica, e foi assim que decidi participar do processo seletivo na Unesp de Marília. Além disso, entendi o doutorado como uma possibilidade de ter um melhor perfil profissional e por tanto, mais instrumentos para alcançar um melhor plano de carreira. A escolha do tema veio como consequência natural do profundo interesse em contribuir com o setor da agricultura e do desenvolvimento rural de pequenos e médios produtores; é uma forma que encontrei de aplicar meu caminho acadêmico pensando na vocação agrícola dos meus países Brasil e Colômbia. 

DC: Em qual momento de seu tempo no doutorado você teve certeza que tinha uma “tese” e que chegaria aos resultados e conclusões alcançados?

JR: Considero que meu desejo de contribuir com os sujeitos escolhidos, desde o começo me manteve no escopo da pesquisa, porém, eu tinha que desenvolver habilidades para estruturar o projeto e determinar o elemento inédito da tese. Aproximadamente dois meses antes da qualificação veio o convencimento de que tinha um instrumento que podia chegar a ser consistente e com força para ter utilidade social e acadêmica. Sem dúvida, as correções e validação recebidas da banca me ajudaram a confiar em que o processo de construção da tese poderia ter o resultado que eu esperava.

DC: Citaria algum trabalho ou ação decisiva para sua tese? Quem é o autor desse trabalho, ou ação, e onde ele foi desenvolvido?

JR: Vários eventos e de natureza distinta foram decisivos: a leitura de um  capítulo de livro, Camadas de representação de dados e suas especificidades no cenário científico, escrito por Plácida Santos e Ricardo Sant’Ana, do livro Dados Científicos que foi organizado por Guilherme Dias e Bernardina de Oliveira em 2019; duas conversas, com meus irmãos Freddy e Jhonathan, e com meu primo Edgar, todos engenheiros em diferentes áreas e com cursos de pós-graduação sem nenhuma relação com o meu, pois trocando ideias, desejos e dificuldades, se geraram insights valiosos; e o mais importante, uma lembrança, à razão pela qual quis um dia fazer um curso de pós-graduação, ao rever esse fato pude ter a tranquilidade de procurar ser consistente com uma inquietação válida e validada que estava fixa na minha essência. 

DC: Por que sua tese é um trabalho de doutorado, o que você aponta como ineditismo?

JR: Porque ela propõe um marco estruturante que serve para verificar que tanto dados publicados têm a possibilidade de ser realmente aproveitados por um grupo de sujeitos, e ainda, observando se esses dados publicados são sobre as suas necessidades informacionais. A análise considera, por um lado, quem publica os dados, e do outro, quem precisa dos dados, usando as necessidades informacionais de quem precisa dos dados como marco de análise. 

DC: Em que sua tese pode ser útil à sociedade?

JR: A Lei de Acesso à Informação abriu uma importante janela para que governos disponibilizem, entre outros recursos de informação, dados, que podem ser usados por determinados usuários conforme seus interesses, contudo, os atributos com que esses dados são publicados devem ser estudados para verificar se realmente estão sendo aproveitados pelos sujeitos. Por isso, minha tese possui justificativa social que ainda hoje a encontro como válida ao ponto de querer continuar estudando dados que sejam publicados para grupos sensíveis da sociedade.  

DC: Quais são as contribuições de sua tese? Por quê?

JR: A contribuição social coloquei-a na pergunta anterior. A científica, considero que está na análise triangular do fenômeno da abertura e disponibilização de dados de governo, propôs uma forma de intersectar atributos da disponibilização de quem publica dados, atributos do uso por quem precisa desses dados, e por fim, as necessidades informacionais desses usuários. Outra contribuição é sobre a atenção à governança dos dados que são publicados, pois, se bem é certo que os órgãos oficiais estão cada vez mais publicando seus datasets, esse publicador está atento à mensuração do aproveitamento dos dados? 

DC: Quais foram os passos que definiram sua metodologia de pesquisa?

JR: Meu interesse inicial era ter contato direto com pequenos e médios produtores que estivessem associados ou em cooperativas, para entender a forma em que eles estão usando dados publicados pelo governo, contudo, devido ao acontecimento da pandemia, foi difícil realizar quaisquer encontros presenciais. Diante do desafio, encontrei na mineração de texto uma alternativa para extrair unidades textuais em notícias orientadas para meu grupo alvo, e para analisar as três bases da minha pesquisa, os produtores, suas necessidades informacionais, e o publicador dos dados.  

DC: Em termos percentuais, quanto teve de inspiração e de transpiração para fazer a tese? 

JR: Inspiração, 1%, transpiração, 99%. 

DC: Teria algum desabafo ou considerações a fazer em relação à caminhada até a defesa e o sucesso da tese?

JR: Desde o ponto de vista acadêmico não, penso que as dificuldades que atravessei foram necessárias para desenvolver criatividade, perseverança e resiliência que um professor doutor precisa ter. Um desabafo que encontro necessário é em relação ao valor da bolsa que recebemos como discentes de mestrado e doutorado, já foi dito amplamente que esse valor não acompanha o custo de vida no Brasil, ainda menos de quem realiza curso de pós-graduação já com família conformada. 

DC: Como foi o relacionamento com a família durante o doutorado?

JR: Devo começar contando que no início do curso sentia desvantagem por ter que cuidar do meu núcleo familiar, no fundo sentia que isso tirava tempo dos meus compromissos acadêmicos. Aí o meu relacionamento com meu esposo e os filhos não se viu afetado, mas eu guardava essa reflexão e não a estava compartilhando com eles. Afortunadamente pude entender que minha família realmente era meu alicerce, meu sorriso, meu descanso e minha força, a finalização do curso foi um tremendo gozo em grupo. Eles realmente sofreram meu doutorado [sorriso], mas no sentido de ver e escutar as dificuldades, o quanto sacrifício foi necessário para concluir, que sem dúvida, os deixou com experiências positivas que hoje de certa forma se veem desenhadas nos seus próprios caminhos. 

DC: Qual foi a maior dificuldade de sua tese? Por quê?

JR: Várias dificuldades foram se apresentando no percurso, mas a única técnica foi a definição da metodologia, isso me levou um tempo de estudo e reflexão, demorei em encontrar caminhos que me ajudassem a ter uma aproximação justa aos sujeitos que tinha definidos. Devo ainda mencionar que a execução da metodologia também foi desafiadora, porém, pelo trabalho braçal para atender de forma consistente a grande quantidade de dados que devia coletar e processar. No entanto, as maiores dificuldades foram todas pessoais, a ida para a faculdade em outra cidade da minha filha mais velha, o clima de horror durante a pandemia e com ela, o falecimento da senhora Mery, minha mãe, essa foi a maior das dificuldades. 

DC: Que temas de mestrado citaria como pesquisas futuras possíveis sobre sua tese?

JR: Formas de mensuração da absorção de dados de governo (amostras em outros países em vias de desenvolvimento); Viabilidade de uso de dados de governo por micros e pequenos empreendedores individuais; Revisão Sistemática de Literatura sobre necessidades informacionais atendidas na publicação de dados de governo. 

DC: Quais suas pretensões profissionais agora que você se doutorou?

JR: Para começar, sinto uma enorme gratidão com Deus, e a satisfação de ter podido transpirar tanto como para poder terminar o doutorado. A principal pretensão que tinha ao me doutorar era começar logo a transmitir e compartilhar as habilidades adquiridas com jovens que cursassem ensino superior. Queria iniciar com a realização de concursos em universidades públicas do Brasil. Hoje sou professora adjunta da Universidade Federal do Pará. 

DC: O que faria diferente se tivesse a chance de ter começado sabendo o que sabe agora? 

JR: Tudo seria diferente. Concretamente é difícil imaginar, talvez em relação às escolhas metodológicas, elas seriam objeto de mais reflexão. 

DC: Como você avalia a sua produção científica durante o doutorado (projetos, artigos, trabalhos em eventos, participação em laboratórios e grupos de pesquisa)? Já publicou artigos ou trabalhos resultantes da pesquisa? Quais você aponta como os mais importantes?

JR: Iniciando o doutorado percebi que me auto carreguei do peso do grau acadêmico; posso enxergar que pequenas doses de vaidade me frearam em algumas ocasiões, sendo necessárias várias conversas com colegas do grupo de pesquisa e com meu orientador, na busca de confiança retornando a um estado mental que me deixasse plasmar as pesquisas com maior tranquilidade. A dinâmica do grupo de pesquisa permitiu a realização de eventos científicos e a publicação de capítulos de livros que me ajudaram na definição do escopo da minha tese. Os artigos resultantes da tese estão em processo de avaliação. 

DC: Exerceu alguma monitoria/estágio docência durante o doutorado? Como foi a experiência?

JR: Desde o primeiro ano do doutorado pude exercer como professora substituta ministrando aulas nos cursos de Biblioteconomia e Arquivologia na UNESP de Marília. Essa experiência foi muito benéfica pois logo me situei como docente em disciplinas que iria ministrar no futuro.

DC: Elas contribuíram em sua tese? De que forma?

JR: Realmente não, a definição do tema da tese, escopo e impactos foi independente das aulas ministradas, mas a dinâmica de estudo permanente para preparar as aulas me deu um estado mental propício para os desafios inerentes à tese. 

DC: Agora que concluiu a tese, o que mais recomendaria a outros doutorandos e mestrandos que tomassem seu trabalho como ponto de partida?

JR: Podem considerar os dados coletados para propor novas análises, em outros níveis semânticos; outros pesquisadores podem considerar fontes de dados alternativas do lado governo, e ainda, executar o projeto coletando dados diretamente com os sujeitos das duas pontas. 

DC: Como acha que deve ser a relação orientador-orientando?

JR: Honesta, na busca da confiança mútua. Eu tive a fortuna de poder dialogar sobre meus desafios acadêmicos com o professor Ricardo, de uma forma tranquila, e fui compreendida, mas, sobretudo instigada a que, com base nas minhas fortalezas, pudesse aprimorar habilidades e desenvolver outras nas que no momento estava precisando. 

DC: Sua tese gerou algum novo projeto de pesquisa? Quais suas perspectivas de estudo e pesquisa daqui em diante?

JR: Sim, eu pretendo continuar no estudo da aderência que a sociedade está tendo ao volume de dados que está sendo publicado, sobretudo observando grupos sensíveis e que precisam de maior atenção. Tenho uma visão crítica sobre que uma grande quantidade de dados disponíveis, devem ser certamente bem aproveitados, e não unicamente somar às estatísticas oficiais de publicação de dados sobre ações dos governos, esse grande volume deve poder servir para mais que informes sobre cumprimento da Lei de Acesso à Informação. 

DC: O que o Programa de Pós-graduação fez por você e o que você fez pelo Programa nesse período de doutorado?

JR: O programa me deu a oportunidade de ter uma visão de mundo, de cultura, de caminhos possíveis nos quais eu possa devolver à sociedade o que tenho recebido. Embora eu tenha chegado com a decisão clara de ser docente, o programa de pós-graduação direcionou meus esforços para que eu pudesse impactar positivamente os meus alunos. Eu pude contribuir ativamente no grupo de pesquisa trazendo aspectos culturais e profissionais de outro país, da Colômbia, com a minha experiência no mercado e nas discussões e palestras dos eventos e pesquisas realizadas pelo grupo de pesquisa. 

DC: Você por você: 

JR: O doutorado traz no pacote um compromisso grande e importante, onde por mais que o doutorando goste do que faz, haverá situações que precisam recriar nossas forças. Entendi também que mesmo com fraquezas e o surgimento de incertezas, sempre é possível encontrar um outro caminho, um impulso, uma inspiração, um motivo a mais para continuar e não desistir. O curso me deixa com a certeza de que escolhi a melhor opção para poder ajudar na caminhada aos meus futuros alunos. Terminei sendo uma profissional capacitada, e mais do que isso, uma melhor cidadã, filha, irmã, esposa e mãe. Sou grata a Deus por ter vivido isto e por ter-me dado as forças necessárias para concluir. 


Entrevistada: Jacquelin Teresa Camperos Reyes

Entrevista concedida em: 27 maio 2024 aos Editores.

Formato de entrevista: Escrita 

Redação da Apresentação: Herta Maria de Açucena do Nascimento Soeiro

Fotografia: Jacquelin Teresa Camperos Reyes

Diagramação: Herta Maria de Açucena do Nascimento Soeiro

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