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v. 2, n. 10, out. 2024
Do sertão à docência: a jornada de uma bibliotecária, por Adelaide Helena

Do sertão à docência: a jornada de uma bibliotecária, por Adelaide Helena

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Do sertão à docência: a jornada de uma bibliotecária

Adelaide Helena Targino Casimiro

adelaide_helena@hotmail.com

Eu sou de uma cidade pequena do alto sertão paraibano chamada Santa Cruz, foi nela onde aprendi a ser eu e de onde vem minhas maiores inspirações de construção de futuro. Eu já saí de lá há muitos anos em busca de oportunidades para meu crescimento pessoal e profissional, mas acredito que Santa Cruz nunca saiu de mim e sou grata por isso. 

Do núcleo familiar mais próximo a mim, sou a 4ª Bibliotecária e (até o momento do fechamento deste texto) a primeira com doutorado. Meu pai é comerciante e minha mãe professora escolar. Acho que para contar minha história, os melhores pontos de partida são estas informações.

Desde o início da minha jornada, o livro, a leitura e a informação sempre me fascinaram. A ideia de que a informação é um recurso valioso, capaz de transformar vidas e sociedades, me motivou a explorar esse campo e transformou a minha vida no processo.

Ao longo dos anos, tive a oportunidade de me aprofundar em diversas áreas, tais como Gestão do Conhecimento (GC), comunicação científica, restauração documental, tecnologias pós-humanistas e o papel das unidades de informação como bibliotecas, arquivos e museus na preservação e difusão da informação.

Minha trajetória começou com a graduação em Biblioteconomia na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Durante esse período, percebi a importância de entender as necessidades dos usuários e como as bibliotecas podem ser espaços de inclusão e aprendizado. Essa experiência me levou a me envolver em monitoria, projetos de pesquisa e de extensão que buscavam melhorar o acesso à informação e desmistificar o fazer-ciência. 

Desde esse período, e sob a orientação de professoras brilhantes, desenvolvi como missão de vida aproximar a sociedade daquilo que é discutido dentro dos muros das universidades brasileiras, a Ciência da Informação (CI) pode ter um grande impacto social quando bem compreendida.

Durante os 5 anos desta formação fiz muitos cursos, participei de eventos, publiquei em periódicos, desenvolvi pesquisas e, mais próximo ao fim desta experiência, tive a oportunidade de trabalhar como restauradora de documentos de papel no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) na Superintendência da Paraíba para o projeto Rede de Arquivos IPHAN, que visava a restauração, descrição, indexação, organização, acondicionamento, digitalização e disponibilização através da base de dados de parte do acervo arquivístico desta instituição. 

Era um projeto com atuação em todas as regiões brasileiras, foi financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e gerenciado pela Fundação Darcy Ribeiro (FUNDAR) em parceria com a Universidade de São Paulo (USP) e a Superintendência do IPHAN no Rio de Janeiro. 

Meus colegas Arquivistas me ensinaram muito e trabalhar em um arquivo diariamente me fez querer propor benesses para este espaço, tanto que meu tema de monografia foi realizar uma revisão de literatura sobre a conservação, preservação e restauração de documentos no Brasil de 1995 a 2015, era uma forma de aprender ainda mais a teoria daquilo que vivenciava na prática.

Ter a oportunidade de aproveitar a graduação de forma integral e participar de todas as iniciativas que estivessem ao meu alcance, moldaram a profissional que sou e desejo ser. Universidade pública, gratuita e de qualidade como as encontradas no Brasil são vitais para aqueles que almejam mudar o status quo de onde vieram, foi por meio dos incentivos financeiros propiciados pela UFPB e a orientação de professores ao longo do processo de graduação que me fizeram perceber o quanto gosto de aprender e de ensinar. 

Foi neste período que decidi que a minha contribuição para a melhoria do espaço onde vivo seria através da promoção da educação, talvez dessa forma eu conseguisse transformar a vida de outras pessoas, como a minha também o foi.

Após a graduação, tive o apoio familiar e decidi continuar meus estudos rumo à docência. Desta forma, ingressei no mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação (PPGCI) da UFPB. Foi nesse momento que comecei a me interessar mais profundamente pela forma como a gestão de pessoas pode influenciar na forma como estas aprendem e ensinam, mais especificamente avaliei a formação dos professores efetivos dos cursos de bacharelado em Arquivologia.

O objetivo da dissertação foi avaliar se as competências técnico-profissionais dos professores correspondiam às exigências das disciplinas, utilizando metodologia documental e análises qualitativas e quantitativas de extração de dados dos currículos Lattes dos docentes. Os resultados indicaram que a Gestão por Competências (GpC) era parcialmente aplicada: enquanto em metade dos casos a alocação dos professores estava alinhada com suas competências, a outra metade não apresentava o mesmo grau de correspondência. 

O estudo sugeria que uma aplicação mais eficaz da GpC poderia resolver problemas existentes e oferecer benefícios significativos para o serviço público, propondo-a como uma solução potencial para as questões nos cursos de Arquivologia.

À época, compreendi que mesmo que as áreas como Biblioteconomia, Ciência da Informação, Museologia, História e Administração discutam a criação, organização e compartilhamento de informação como cerne do debate científico (respeitando as particularidades e limites de cada uma), os professores com esta formação não deveriam substituir integralmente os Arquivistas no processo de ensino-aprendizagem da Arquivologia, era preciso ter, também, docentes com esta expertise para que a capacitação fosse mais efetiva desde a graduação. 

Durante o mestrado, participei de seminários e workshops que discutiam a importância da comunicação clara e acessível. 

Essa experiência me fez refletir sobre a responsabilidade dos profissionais da informação em garantir que a informação correta chegue ao público certo.

Com o avanço da tecnologia, percebi que a CI também enfrenta novos desafios. A era digital trouxe uma avalanche de dados e informações, mas também gerou preocupações sobre a qualidade e a veracidade destes e o papel dos profissionais da informação nisso tudo. 

Além disto, como os humanos podem continuar ou ingressar no mercado de trabalho, sendo que este já tem grande parte das suas funções automatizadas por máquinas e tecnologias pós-humanistas como a inteligência artificial? Esta era uma questão que me inquietava, pois ao mesmo tempo que avançava na minha formação, percebia que as oportunidades de emprego para o meu nicho já não apareciam com a frequência e volume de outrora.

Cercada de perguntas (como toda boa cabeça de pesquisadora deve ser), ingressei no doutorado do PPGCI/UFPB com a intenção de trazer algumas respostas às minhas dúvidas e me capacitar para tornar-me a melhor docente que eu pudesse ser. Foi nessa época que atuei como professora substituta na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) pela primeira vez (retornei para o mesmo cargo recentemente) e pude sentir o gostinho de como é vivenciar a docência. 

]Tentei aplicar todos os conhecimentos reunidos ao longo da vida e sinto que aprendi muito mais com meus alunos, sobretudo, porque juntos passamos pela pandemia de COVID-19 e desenvolvemos métodos para manter o processo de ensino-aprendizagem no ambiente virtual em meio ao caos mundial. 

Além disso, ao término do meu contrato com a UFRN, consegui uma bolsa CAPES de doutorado sanduíche no exterior para a Universidade de Coimbra, em Portugal, onde passei seis meses desenvolvendo minha pesquisa e atuando como auxiliar dos técnicos superiores e assistentes técnicos no Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC).

O timing da temática estudada por mim foi preciso, a pesquisa examinou como as mudanças tecnológicas estão moldando o perfil desejável do Arquivista no mercado de trabalho, diante da crescente demanda por habilidades em gerenciamento de recursos tecnológicos. Utilizando uma abordagem metodológica que combinou análise qualitativa e quantitativa, incluindo revisão sistemática da literatura e métodos como Grupo Focal e Delphi, o estudo identificou cenários prospectivos para a profissão de Arquivista. Os resultados destacaram a influência de fatores como Matriz Curricular, Marketing, Educação Continuada e Concurso Público, revelando a necessidade de ajustes na formação, estratégias de marketing eficazes e engajamento associativo para que os Arquivistas mantenham sua relevância. 

A pesquisa ainda traz sugestões para futuras investigações e enfatiza a importância de uma visão estratégica e conscientização tecnológica para enfrentar os desafios e assegurar a relevância profissional no mercado.

Atualmente, estou focada em consolidar minha trajetória acadêmica e profissional, mesmo enfrentando o desafio de não ter um emprego efetivo no momento. Sigo focada em consolidar minha trajetória acadêmica e profissional, sempre com a perspectiva de impactar positivamente os campos da Ciência da Informação, da Biblioteconomia e da Arquivologia. 

Experiências práticas e acadêmicas, como meu trabalho no AUC e na UFRN e a adaptação ao ensino remoto durante a pandemia, foram cruciais para moldar minha abordagem pedagógica e minha visão sobre a importância da integração de novas tecnologias no ensino e na prática do profissional da informação.

Para o futuro, minha meta é conquistar a tão sonhada vaga como professora efetiva em uma instituição de ensino superior e continuar a contribuir para a evolução da ciência, explorando novas maneiras de adaptar a formação acadêmica às exigências do mercado e às mudanças tecnológicas. 

Pretendo expandir minhas pesquisas e colaborar em projetos que promovam a atualização dos currículos e práticas profissionais, fortalecendo o papel dos profissionais da informação em um mundo cada vez mais virtual. Além disso, busco engajar-me em iniciativas que promovam a educação continuada e a inovação no setor, garantindo que os profissionais da área estejam melhor preparados para enfrentar os desafios futuros e aproveitar as oportunidades que surgirem. 

Não tem sido fácil, mas acredito que a garotinha que saiu de Santa Cruz estaria muito orgulhosa da adulta que me tornei e do mundo que estou ajudando a construir.

Referências:

CASIMIRO, Adelaide Helena Targino. BRAPCI: o panorama da conservação, preservação e restauração de documentos no Brasil. 2016. 143 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Biblioteconomia) – Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2016. Disponível em: https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/123456789/1945 . Acesso em: 28 set. 2024.

CASIMIRO, Adelaide Helena Targino. Gestão por Competências nos cursos de Arquivologia no Brasil: abordagem nos princípios da Gestão do Conhecimento. 2019. 146 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) – Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2019. Disponível em:  https://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/biblio/article/view/48500  Acesso em: 28 set. 2024.

CASIMIRO, Adelaide Helena Targino. Tecnologias pós-humanistas e o mercado de trabalho brasileiro para Arquivistas: percepções e desafios por meio de estudos de cenários prospectivos. 2023. 163 f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) – Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa, 2023. Disponível em:  https://repositorio.ufpb.br/jspui/handle/123456789/31342  . Acesso em: 28 set. 2024.

Sobre a autora:

Adelaide Helena Targino Casimiro

É professora substituta do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Co-criadora do site Pesquisas Arquivísticas Brasileiras (PAB) e do blog SOS NormalizAção. Participante do Grupo de Pesquisa Informação, Aprendizagem e Conhecimento (GIACO) da Universidade Federal da Paraíba.

Doutora e Mestra em Ciência da Informação pela Universidade Federal da Paraíba. Bacharela em Biblioteconomia pela Universidade Federal da Paraíba. 


Redação e Foto: Adelaide Helena Targino Casimiro

Diagramação: Jônatas Silva dos Santos

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