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v. 3, n. 6, jun. 2025
Editorial: Divulgação da literatura LGBTQIA+ nas redes sociais: a construção do pertencimento, por Letícia Bonetti

Editorial: Divulgação da literatura LGBTQIA+ nas redes sociais: a construção do pertencimento, por Letícia Bonetti

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Divulgação da literatura LGBTQIA+ nas redes sociais: a construção do pertencimento

Letícia Bonetti
leticia.bonetti.tt@gmail.com

A literatura é uma manifestação artística capaz de criar e transmitir emoções, ideias e histórias. Ela é um reflexo da sociedade, mas também a afeta diretamente, podendo gerar tanto um sentimento de exclusão como o de pertencimento. E foi com isso em mente que criei meus perfis literários nas redes sociais (@biblioleticia).

Nascida nos anos 90, minha adolescência foi permeada por uma sensação de não pertencimento. Meu amor pela leitura encontrava como obstáculo a falta de representatividade LGBTQIA+ nos livros, o que impactou diretamente como eu me enxergava no mundo. Assim como nas demais mídias, o que se via na literatura da época era a dominância da narrativa heterocisnormativa. 

Fora do gênero do romance, era ainda mais improvável encontrar protagonistas que desafiassem a narrativa dominante. Como se sentir normal e válido em um contexto em que suas vivências nunca são contadas?

Essa inquietação me acompanhou durante a fase adulta, quando livros com protagonistas LGBTQIA+ começaram a ganhar espaço no mercado tradicional, mesmo que de forma escassa. Entretanto, havia ainda um sentimento de marginalização, reforçado por eventos como a censura na Bienal do Rio de Janeiro de 2019, quando o prefeito Marcelo Crivella determinou o recolhimento de livros com personagens LGBTQIA+. 

O prefeito considerou as obras impróprias e decretou que elas deveriam ser comercializadas dentro de embalagens lacradas com advertência de conteúdo. A atitude foi seguida por protestos e intervenções judiciais, mas reforçou a sensação de perseguição e exclusão às narrativas diversas. Com isso, outra pergunta me surgiu: como se sentir normal e válido em um contexto em que suas vivências são demonizadas?

Um ano depois desse evento, comecei a produzir conteúdo nas redes sociais, principalmente no TikTok, uma plataforma bastante consumida pelo público jovem. Em 2021, eu tinha um público consolidado que compartilhava do mesmo sentimento de exclusão. O desejo comum era ver a normalização de personagens queer nos livros e nas narrativas mais diversas, sendo heróis, vilões, mocinhos, criaturas mágicas, príncipes, princesas, e todos os demais papéis que sempre foram naturalmente tomados por personagens héteros e cis. 

Silva (2023, p. 41), nesse sentido, explica que “as mediações cultural e de leitura da literatura LGBTQIA+ fazem-se importantes acontecerem/balizarem para ainda mais humanizarem e, com isto, mais do que sobreviver, que as pessoas LGBTs vivam de modo mais tranquilo em sociedade”. Temos o direito de existir e, mais que isso, temos o direito a um final feliz (na vida real e nos livros).

Página inicial do Instagram do perfil Letícia || Bookstagram “Biblioleticia”

Meu trabalho nas redes sociais é uma forma de reforçar essa mensagem e de unir duas paixões minhas: a biblioteconomia e os livros. Eu tive a honra de receber mensagens de agradecimento tanto pela divulgação da profissão como também por criar nas pessoas o amor pela leitura, algo que nós, pessoas bibliotecárias, sonhamos tanto quando estamos dentro das bibliotecas escolares. Como disse Cavalcante, Queiroz e Sousa (2020, p. 22), “quanto mais se incentiva o ato de ler, mais se contribui para a formação de uma sociedade leitora. Daí, a importância do trabalho de mediadores e mediadoras para que as pessoas descubram na leitura o prazer de conhecer, descobrir e viajar no universo literário.” E isto está muito ligado ao processo de identificação com as histórias lidas.

A biblioteconomia tem um aspecto social muito forte, e isso sempre me motivou a continuar com o meu trabalho nas redes sociais, divulgando literatura de um grupo há muito marginalizado. Afinal, “a literatura pode ser facilitadora e mediadora para que a identidade de gênero e a sexualidade sejam expressas de modo que não ocasionam sofrimento, em especial, no momento de descoberta e construção de sua identidade (de gênero e sexual)” (Sabbá; Resende, 2024, p. 245). 

É através dessa divulgação ampla da literatura, com protagonismo LGBTQIA+, que nós da comunidade conseguimos marcar nossa existência e contar nossas histórias. Mais do que ver essas vivências sendo impressas por editoras tradicionais, meu desejo é criar um ambiente seguro nas minhas redes sociais para que jovens consigam encontrar, na leitura, o acolhimento que muitas vezes não têm em casa.

Página inicial do TikTok do perfil Letícia || Bookstagram “Biblioleticia”

A literatura é um instrumento não só de conscientização, mas também de transformação social (Silva, 2023), e é pensando nisso que produzo meu conteúdo para as redes sociais. Hoje, somos mais de 600 mil seguidores no TikTok (@biblioleticia) e mais de 80 mil no Instagram (@biblioleticia). Isso, para mim, é um reflexo da importância da divulgação de obras escritas e protagonizadas por grupos marginalizados. Existe um público amplo que deseja consumir essas obras, e eu busco ser uma ponte entre a pessoa leitora e o livro, algo tão intrínseco à minha profissão.

Para isso, tento estar sempre em contato com meus seguidores para identificar demandas. Costumo receber mensagens no privado com sugestões de publicações, mas também gosto de criar posts com indicações literárias que eu queria ter recebido na minha adolescência, quando estava me entendendo LGBT+. Como atualmente trabalho com pesquisa no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict), preciso conciliar meu emprego com a rotina de criação de conteúdo. Por isso gosto de manter uma lista com as ideias de post para a semana, bem como produzir as artes e os vídeos com antecedência, para facilitar a publicação. 

O foco é trazer indicações novas e de diversos gêneros literários, uma vez que para cada pessoa leitora existe seu livro e vice-versa. É importante bater na tecla de que livros LGBTQIA+ não são um gênero, e sim um tipo de representatividade dentro dos mais diversos gêneros literários, como romance, fantasia, ficção científica, drama, suspense, entre outros. Com isso em mente, quero trazer algumas indicações que tiveram um grande impacto na minha vida como leitora:

Fantasias com protagonismo LGBTQIA+:

  1. Mooncakes de Wendy Xu e Suzanne Walker 
  2. Les Normaux: Garoto encontra vampiro de Janine Janssen e S. Al Sabado 
  3. Os garotos do cemitério de Aiden Thomas 
  4. A vida invisível de Addie LaRue de V.E. Schwab 
  5. O Trono de Jasmin de Tasha Suri 

Romances com protagonismo LGBTQIA+:

  1. Heartstopper de Alice Oseman 
  2. Conectadas de Clara Alves 
  3. Um traço até você de Olívia Pilar 
  4. Pelo quinto andar de Nicoly Pacheco e Yuri Peach
  5. A noite passada no Telegraph Club de Malinda Lo 
  6. Os sete maridos de Evelyn Hugo de Taylor Jenkins Reid 

Suspenses e sci-fi com protagonismo LGBTQIA+:

  1. Gearbreakers: matadores de robôs de Zoe Hana Mikuta
  2. As últimas sobreviventes de Jennifer Dugan 
  3. Viúva de ferro de Xiran Jay Zhao 
  4. É assim que se perde a guerra do tempo de Amal El-Mohtar e Max Gladstone
  5. Ás de espadas de Faridah Faridah Àbike-Íymídé 

Referências

CAVALCANTE, L. E.; QUEIROZ, D.; SOUSA, L. F. de. Mediações de Leitura: o ato de ler que nos conecta. Fortaleza: Edições Pausa, 2020.

SABBÁ, A. C. Q.; RESENDE, G. C. A representatividade da literatura LGBTQIA+ nas vidas de jovens leitores universitários. Diversidade e Educação, v. 12, n. 1, p. 237–254, 2024. Disponível em: https://periodicos.furg.br/divedu/article/view/17381 . Acesso em: 21 maio 2025.

SILVA, P. S. Q. As mediações cultural e de leitura da literatura LGBTQIA+. 2023. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Biblioteconomia) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2023. Disponível em: https://repositorio.ufpe.br/handle/123456789/51680 . Acesso em: 21 maio 2025.

Sobre a autora:

Letícia Bonetti

Pesquisadora bolsista no Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia, desenvolvendo serviços na área de Ciência Aberta e repositórios de dados.

Mestra em Ciência da Informação pela Universidade Federal de São Carlos. Bacharela em Biblioteconomia pela Universidade de Brasília.


Redação: Letícia Bonetti

Foto: Letícia Bonetti

Revisão: Herta Maria de Açucena do N. Soeiro

Diagramação: Herta Maria de Açucena do N. Soeiro

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