
Desenvolvimento da Competência em Informação para as pessoas LGBTQIAPN+ – Entrevista com André Luiz Avelino da Silva

Desenvolvimento da Competência em Informação para as pessoas LGBTQIAPN+ – Entrevista com André Luiz Avelino da Silva
André Luiz Avelino da Silva
andre_luiz93@live.com
Sobre o entrevistado
Em 2023, André Luiz Avelino da Silva defendeu sua dissertação de mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal de Santa Catarina, sob a orientação da Profa. Dra. Elizete Vieira Vitorino.
Natural de Manaus, Amazonas, André atua como Bibliotecário responsável pelas Bibliotecas Escolares na Rede Municipal de Educação de Itapema, em Santa Catarina. Em seu tempo livre, aprecia ir à praia.
Sua dissertação, intitulada “Desenvolvimento da Competência em Informação para as pessoas LGBTI+: com foco em atitudes, comportamentos, habilidades, valores e conhecimentos“, aborda a construção de um Programa de Desenvolvimento de Competência em Informação – PDCIn, com foco na população LGBTQIAPN+, envolvendo as características atitudes, comportamentos, valores, habilidades e conhecimentos. Considerando que esse grupo social enfrenta preconceitos e discriminações na sociedade brasileira, a criação de seu Programa pode contribuir para o enfrentamento da vulnerabilidade social.
Nesta entrevista, André compartilha sua trajetória acadêmica e os aprendizados construídos em seu processo de mestrado.
Divulga-CI: O que te levou a fazer o mestrado e o que te inspirou na escolha do tema da dissertação?
André Avelino (AA): Comecei a ler sobre a população LGBTQIAPN+, especialmente por fazer parte desse grupo social. Compreendendo os fatores de preconceito e as violências que ocorrem, tive vontade de fazer algo. Em paralelo, estava sentindo falta do ambiente acadêmico e decidi levar o tema para a minha pesquisa. Conheci o tema da Competência em Informação lendo os trabalhos de Elizete Vitorino e de Guilherme Righetto. Fiquei empolgado e inspirado pelos textos deles.
DC: Quem será o principal beneficiado dos resultados alçados?
AA: A população LGBTQIAPN+. Entretanto, ainda não foi possível colocar em prática, a ideia é que o que foi construído no mestrado possa ser desenvolvido em alguma ONG LGBTQIAPN+.
DC: Quais as principais contribuições que destacaria em sua dissertação para a ciência e a tecnologia e para a sociedade?
AA: A estrutura de um PDCIn pode contribuir com pesquisas e práticas envolvendo grupos historicamente discriminados. Pensar um programa que relacione a Competência em Informação com grupos vulneráveis vai ao encontro do Manifesto de Florianópolis, de 2013, que chama a atenção para o fato de que a academia, as entidades associativas, os profissionais etc. têm responsabilidades no combate às desigualdades sociais. Pensar nesse PDCIn é tentar contribuir com essa responsabilidade, trazendo da ciência para a sociedade formas de combater as injustiças que ocorrem contra grupos sociais marginalizados, como a população LGBTQIAPN+.
DC: Seu trabalho está inserido em que linha de pesquisa do Programa de Pós Graduação? Por quê?
AA: Na linha de pesquisa 02: Informação, Comunicação Científica e Competência. Pois minha pesquisa visou a construção de um Programa de Competência em Informação.
DC: Citaria algum trabalho ou ação decisiva para sua dissertação? Quem é o autor desse trabalho, ou ação, e onde ele foi desenvolvido?
AA: O livro TransLiteracy, do Guilherme Righetto e Elizete Vitorino, há entrevistas com pessoas trans de Florianópolis (SC) são bem impactantes. Além disso, o Programa Brasil Sem Homofobia, do Governo Federal, de 2004 e o Programa TransCidadania, do Governo de São Paulo também foram fundamentais para pensar a estrutura do Programa com foco na população LGBTQIAPN+, uma vez que tais programas tinham foco nas especificidades desses grupos sociais, pensando em formas de contribuir para o combate ao preconceito, as desigualdades, etc., bem como o documento sobre diretrizes sobre habilidades informacionais, de Jesus Laú, da IFLA, trazendo a perspectiva da informação.
DC: Quais foram os passos que definiram sua metodologia de pesquisa?
AA: Pesquisa bibliográfica e documental, em bases de dados como a BRAPCI, SciELO e CAPES, além de documentos de ONGs LGBTQIAPN+ que trazem dados estatísticos sobre a realidade dessa população, uma vez que o Estado brasileiro não possui políticas públicas nesse sentido. No máximo foi possível pegar dados do Atlas da Violência.
DC: Quais foram as principais dificuldades no desenvolvimento e escrita da dissertação?
AA: A pandemia. Quando comecei o mestrado, estava em Manaus, em 2021. Naquela ocasião, a cidade estava um caos, especialmente devido à falta de oxigênio. Morava com meus pais, que são idosos, então eu era responsável por sair para resolver o que fosse necessário. Havia também a expectativa de que a UFSC retornasse ao presencial, o que me preocupava por conta dos meus pais. No final desse ano, minha mãe teve câncer e passou por uma cirurgia. Nesse momento, eu já havia qualificado e estava na escrita da dissertação, o que tornou a fase ainda mais complicada. Após a última cirurgia dela, viajei para SC, pois precisava realizar o estágio de docência. Foram muitas situações ocorrendo: mudança de cidade, de cultura, de vida, adaptações, preocupações – mas, no fim, deu tudo certo.
DC: Em termos percentuais, quanto teve de inspiração e de transpiração para fazer a dissertação?
AA: A ideia inicial da dissertação era realizar pesquisa de campo em uma casa de acolhimento, em Manaus (AM). infelizmente, em razão da pandemia, optou-se pela pesquisa teórica, de modo que também foi necessário mudar o foco do projeto da dissertação. Investigar as características da Competência em Informação foi o maior desafio, ler e entender sobre atitudes, comportamentos, habilidades, valores e conhecimentos, bebendo de outras áreas como a Psicologia Social, Educação, Filosofia e Administração foi um desafio.
DC: Teria algum desabafo ou considerações a fazer em relação à caminhada até a defesa e o sucesso da dissertação?
AA: Tive muita sorte em ter a profa. Dra. Elizete Vitorino como minha orientadora, apesar dos contratempos enfrentados. Ela sempre foi atenciosa, acolhedora e com muita empatia para compreender algumas dificuldades. Sou eternamente grato pela contribuição dela na minha formação, uma pessoa maravilhosa da qual tenho grande carinho e afeto, trago para a vida.
DC: Como foi o relacionamento com a família durante este tempo?
AA: De apoio, meus pais torcem muito por mim, também morei uns tempos na casa da minha irmã. Ela também foi grande incentivadora e apoiadora, vibrou pela minha conquista com a defesa.
DC: Agora que concluiu a dissertação, o que mais recomendaria a outros mestrandos que tomassem seu trabalho como ponto de partida?
AA: Acredito que o principal é ter um bom diálogo com o orientador ou a orientadora; essa relação é fundamental para que a trajetória seja feliz e agradável. A pós-graduação, em si, pode ser solitária, mas são as pessoas que nos ajudam a seguir em frente, seja pela relação com a orientadora, seja pelos colegas que vamos conhecendo. Além disso, para mim, é importante que a pessoa goste do tema pesquisado; ela precisa ter uma relação de “carinho” pela sua pesquisa, caso contrário, será difícil dar continuidade quando os desafios surgirem.
DC: Como você avalia a sua produção científica durante o mestrado (projetos, artigos, trabalhos em eventos, participação em laboratórios e grupos de pesquisa)? Já publicou artigos ou trabalhos resultantes da pesquisa? Quais você aponta como os mais importantes?
AA: Posso citar alguns recentes: “A construção teórica de um programa voltado para a população LGBTQIAPN+ pelo viés da Competência em Informação: o PDCIn-LGBTI+”, publicado pela REBEH. Resumo no CBBD: “Competência em Informação e população LGBTQIAPN+: uma proposta de um Programa Social para combater às vulnerabilidades sociais”.
DC: Desde a conclusão da dissertação, o que tem feito e o que pretende fazer em termos profissionais?
AA: Tenho desenvolvido uma pesquisa com o grupo Alaye, do prof. Dr. Erinaldo Valério, da UFPE, sobre competência em informação antirracista. Seguindo no doutorado, embarcando na Epistemologia Social, mas mantendo a população LGBTQIAPN+ como parte da minha pesquisa acadêmica. Também me tornei bibliotecário efetivo em Itapema, SC.
DC: Pretende fazer doutorado? Será na mesma área do mestrado?
AA: Sim, estou no segundo ano do doutorado, no mesmo programa, PGCIN-UFSC, mas com outro tema conforme mencionado acima, com orientação do Prof. Dr. Rodrigo de Sales.
DC: O que faria diferente se tivesse a chance de ter começado sabendo o que sabe agora?
AA: Possivelmente, teria inserido discussões com a interseccionalidade e com um viés mais anticapitalista. Algumas leituras me fizeram refletir sobre algumas questões que havia pensado para o PDCIn e hoje vejo de forma diferente, mas entendo que faz parte dessa construção enquanto pesquisador.
DC: O que o Programa de Pós Graduação fez por você e o que você fez pelo Programa nesse período de mestrado?
AA: O PGCIN foi receptivo e ajudou a tirar todas as dúvidas, principalmente devido ao contexto de pandemia, no início. Eu busquei cumprir com os prazos, realizar publicações e levar o nome da Instituição comigo. Tenho muito orgulho de fazer parte da UFSC, de ser parte do PGCIN, sou grato aos professores e professoras que contribuíram e contribuem para a minha formação, agora em continuidade no doutorado.
DC: Você por você:
AA: Uma pessoa entusiasmada com a vida e com tudo aquilo que faz. Como bom sagitariano que sou, me entrego para a vida, seja no campo profissional, acadêmico, pessoal, estou sempre me dedicando no que estou envolvido, o mesmo para as relações familiares, sociais, etc. O adolescente que um dia sonhou em entrar na universidade pública, jamais imaginou que estaria um dia cursando doutorado, especialmente dado meu contexto, meus pais fizeram até a quarta série do fundamental, primeiro da família a entrar na pós-graduação. Espero poder contribuir com o combate às desigualdades sociais no que diz respeito aos grupos historicamente discriminados, tendo em vista que faço parte da população LGBTQIAPN+, acredito ser um dever ético. Gosto de acreditar que é possível transformar a sociedade, mas é um processo lento e com base na luta, nas mais variadas instâncias, o que tiver ao meu alcance para isso, farei.
Entrevistado: André Luiz Avelino da Silva
Entrevista concedida em: 25 abr. 2025.
Formato de entrevista: Escrita
Redação da Apresentação: Larissa Alves
Fotografia: André Luiz Avelino da Silva
Diagramação: Larissa Alves