
Muitos heróis e poucas heroínas: a luta pela representatividade feminina no Acervo do Museu Histórico Nacional

Muitos heróis e poucas heroínas: a luta pela representatividade feminina no Acervo do Museu Histórico Nacional
Pesquisadora promove discussão acerca da representatividade da mulher em museus
Desde o segundo semestre de 2022, foi alterada a definição de museu, aprovada pelo Conselho Internacional de Museus (ICOM) e elaborada de forma colaborativa com representantes de diversos países. Nessa nova definição, o museu é compreendido como uma instituição permanente, sem fins lucrativos, a serviço da sociedade, que pesquisa, coleciona, conserva, interpreta e expõe o patrimônio material e imaterial, destacando inclusão, acessibilidade e o fomento à diversidade e à sustentabilidade. A documentação e a conservação são de grande relevância para a história, a consciência e a memória de um povo, abrangendo sua expressão, modo de viver, pensar, desenvolvimento e aprendizado, consolidando o museu como uma instituição a serviço da sociedade. Com base nessa percepção, torna-se fundamental a sua participação no engajamento e na contribuição frente a problemas contemporâneos. Assim, ressalta-se a importância de abordar elementos como invisibilidade e representatividade no papel da mulher na sociedade e na construção do feminino.
Na dissertação “Muitos heróis e poucas heroínas? A presença da mulher no acervo de pinturas da exposição de longa duração do Museu Histórico Nacional”, a pesquisadora Flávia Limoeiro Figueiredo busca identificar a representação das mulheres, considerando aspectos expográficos, museológicos e sociais.

A principal questão apresentada na pesquisa é: qual o lugar ocupado pela mulher no circuito expositivo de longa duração do Museu Histórico Nacional, em 2018? Para tanto, foram selecionadas duas obras: os retratos da Marquesa de Santos e de Anita Garibaldi, atribuídos, respectivamente, a Francisco Pedro do Amaral e Joaquim da Rocha Ferreira. Para enriquecer o estudo, foram realizadas entrevistas com o ex-diretor do museu, o historiador Paulo Knauss, e com um grupo de ex-funcionários envolvidos na exposição, utilizando questionários para compreender suas percepções sobre a representatividade das mulheres no museu.

“A relevância de assuntos como documentação e conservação é inquestionável, e sabemos que essas áreas não podem prescindir de um trabalho aprofundado de pesquisa. Contudo, uma abordagem mais crítica e contemporânea da atuação dos profissionais dos museus, com foco em questões sociais, amplia a discussão em torno de categorias e temas marginalizados e, de certa forma, corroborados em narrativas oficiais. Por que, para quem e como estamos atingindo a sociedade por meio dos espaços museais?”, pontua a autora.
A necessidade de abordar o tema surgiu a partir da atuação da pesquisadora no Museu Histórico Nacional, ao perceber a ausência de representatividade de grupos como negros, povos originários, LGBTQIAP+ e mulheres. Desenvolvendo o estudo com foco na figura da mulher nesses espaços, verificou-se, por meio de entrevistas e relatos de visitantes, que muitos não se sentiam representados em um museu cuja narrativa central, concentrada na História “Nacional”, deveria contemplar a diversidade das ações realizadas por homens e mulheres que participaram e participam da construção do país.
As análises preliminares apontaram a predominância da mulher em papéis coadjuvantes, como esposas, matriarcas ou ligadas a temas religiosos. Essa percepção também é destacada por outros autores, que observam que os museus apresentam demarcações de gênero, depreciando ou mal representando a produção feminina e a história das mulheres. O estudo da pesquisadora traz à tona como os museus, ao longo de sua história moderna, têm sido espaços voltados à exposição e apreciação de identidades masculinas, reforçando ideias de uma sociedade patriarcal. Poucas narrativas femininas ganham espaço e, quando o fazem, são subjugadas. Esses pontos destacam a discrepância entre a presença de homens e mulheres nos lugares de destaque no acervo.

“Muitos heróis e poucas heroínas? A pergunta que compõe o título desta dissertação trouxe mais questões do que soluções, considerando que o espaço da exposição de longa duração do MHN é predominantemente ocupado por figuras masculinas, brancas e pertencentes à elite. A equiparação de direitos, tão solicitada pelos movimentos feministas, faz-se necessária também na ocupação dos espaços museais históricos. Mesmo mulheres brancas e pertencentes à elite, como a Marquesa de Santos, não tinham seus retratos exibidos, assim como Anita Garibaldi, figura revolucionária. Ambos os acervos, pertencentes ao MHN, foram exibidos na exposição de longa duração de 2018. As histórias dessas mulheres, embora diferentes, se encontram. Ambas lutaram por seus espaços na sociedade, enfrentaram violência doméstica e ousaram trilhar caminhos distintos dos atribuídos às mulheres de suas épocas”, declara a autora.

A pesquisadora conclui sobre a importância de não naturalizar a ausência das mulheres nos museus, independentemente de sua posição social, algo que já ocorre com outros grupos, como negros, indígenas, pessoas com deficiência, LGBTQIAP+, entre outros. Apesar de avanços, como a inclusão de diversidade na nova definição de museus do ICOM, é urgente pensar em projetos e políticas de aquisição de acervos que contemplem grupos invisibilizados, além de promover ações educacionais nos museus e políticas públicas e culturais que fomentem a reflexão sobre o tema. O estudo constata que a representatividade feminina, assim como a de outros grupos, ainda tem um longo caminho a percorrer nas discussões nos museus, na cultura e na sociedade. No entanto, questionamentos como os apresentados nessa pesquisa, junto a reflexões e relatos de visitantes, podem contribuir para soluções futuras.
Acesse a dissertação em:
FIGUEIREDO, Flávia Limoeiro. Muitos heróis e poucas heroínas? A presença da mulher no acervo de pinturas da exposição de longa duração do Museu Histórico Nacional. 2023. 136 f. Dissertação (Mestrado em Memórias e Acervos) — Fundação Casa de Rui Barbosa, Rio de Janeiro. 2023. Disponível em: https://rubi.casaruibarbosa.gov.br/handle/20.500.11997/18119 . Acesso em: 08 de janeiro de 2025.
Redação: Tânia Rangel
Revisão: Pedro Ivo Silveira Andretta
Diagramação: Marcos Leandro Freitas Hübner