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v. 3, n. 6, jun. 2025
Quantas editoras publicam com exclusividade livros com temas LGBTQIAPN+ no Brasil?, por Alex Francisco

Quantas editoras publicam com exclusividade livros com temas LGBTQIAPN+ no Brasil?, por Alex Francisco

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Quantas editoras publicam com exclusividade livros com temas LGBTQIAPN+ no Brasil?

Alex Francisco
alexcfrancisco@gmail.com

A resposta à pergunta-título desse texto está no livro “Páginas Coloridas – Editoras Independentes pela Diversidade Sexual e de Gênero” (2024), publicado pela Com-Arte, editora laboratório do curso de Editoração da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). O caminho até essa resposta foi complexo. Começou após a leitura do dossiê “O Movimento LGBT Brasileiro: 40 anos de Luta” (revista Cult, 2018). Nele, os textos abordam as mudanças de comportamento pela qual a sociedade brasileira passou no final dos anos 1970, no abrandamento do regime militar (1964-1985), e de como a comunidade homossexual se reorganizou em meio à repressão[1].

O dossiê da Cult me levou ao livro “Ditaduras e Homossexualidades: Repressão, Resistência e Busca pela Verdade”, organizado por James N. Green e Renan Quinalha. Um dos artigos da publicação aborda o grupo de artistas, jornalistas e intelectuais que, de 1978 a 1981, enfrentaram o controle moral praticado pelo governo ao colocar nas bancas, no contexto da imprensa alternativa, o jornal Lampião da Esquina. Dedicado ao público gay e pioneiro ao se espalhar pelo país com a premissa de despertar a consciência e identidade homossexual, uma das particularidades do “nanico” era a sistemática indicação de livros com temas homossexuais, seja por meio de seções fixas, reportagens ou nas respostas às cartas dos leitores.

Nasceu, assim, meu interesse em compreender como a literatura foi utilizada de instrumento para o ativismo do movimento homossexual e a capacidade de a mídia impressa mostrar e incluir o leitor no conhecimento da própria realidade e a dos pares por meio da abordagem jornalística e da propagação de narrativas ficcionais presentes nos livros. O projeto do mestrado, que resultou no livro, teve orientação da professora Sandra Reimão.

O Movimento Homossexual Brasileiro (MHB) dos anos 1970 teve a mídia impressa como instrumento para fortalecer a própria identidade e as realidades dos grupos, que hoje transbordam a sigla LGBTQIAPN+. Assim, “Páginas Coloridas” mostra como jornais e revistas que pautaram a diversidade sexual nos últimos anos enfrentaram problemas de ordem estrutural e financeira, e poucos se alinharam às diversas sexualidades que emergiram e migraram para o ambiente digital.

Enquanto a mídia impressa jornalística perdeu expressão no meio, a publicação de livros com narrativas e estudos sobre os corpos e desejos não normativos aqueceu o mercado editorial com autores fenômenos de venda, público leitor engajado, e a criação de editoras independentes e selos especializados. Dentro das mudanças na produção editorial brasileira nos últimos anos e o surgimento de modalidades criativas para produzir e consumir livros no país, há um movimento de editoras especializadas na publicação de livros com temáticas LGBTQIAPN+, nicho que despontou no Brasil nos anos 1990-2000.

Quantas editoras publicam com exclusividade livros com temas LGBTQIAPN+ no Brasil? Em “Páginas Coloridas”, apresento um panorama com 18 editoras (sendo 4 delas selos editoriais) para refletir sobre como, a partir da mídia impressa, as questões do movimento, em consonância com as contribuições dos grupos sócio-acêntricos[2], têm construído debates pela diversidade sexual e de gênero e o desenvolvimento intercultural[3].

O levantamento que resultou no panorama das editoras mostra o crescente surgimento nos últimos anos de agentes engajados na produção independente de títulos pela diversidade sexual e de gênero e da democratização dos modos de produção do livro no país. Com esse levantamento, considero que o estudo da mídia impressa com tema LGBTQIAPN+, em especial o livro, além de necessário, desdobra-se em uma teia complexa de vertentes, contextos e análises. Por isso, o recorte proposto em “Páginas Coloridas”, a edição independente de livros com temas LGBTQIAPN+ no estado de São Paulo, possibilitou observar um microcosmo do que é o mercado editorial e a produção literária desse nicho no país. Nesse sentido, percebo que a publicação independente tem distâncias e proximidades com os padrões tradicionais de edição, produção e comercialização dentro do campo editorial. Ao mesmo tempo, a formação do catálogo é tensionada entre os anseios do mercado, carente de publicações do segmento, e a avaliação do que é produzido.

“Páginas Coloridas” se aprofunda no estudo de caso de três publicadoras paulistas, empreendimentos fundados e liderados por mulheres, o que borra, em partes, a hegemonia masculina no setor – ao menos no estado de São Paulo. As mulheres editoras em questão são Luciana Benatti (Dita Livros), Manuela Neves (Vira Letra) e Paula Curi (Editora PEL). Então, no livro, mostro um perfil dessas mulheres editoras. As histórias mostram como todas elas tiveram o livro como objeto central na infância e adolescência, que a formação em Comunicação foi escolha profissional unânime, que a liberdade do trabalho independente atende aos valores e ideais que ergueram para a estrutura dos empreendimentos e que a rotina de tarefas das empresas está atrelada ao cotidiano pessoal de cada uma delas.

Capa do livro: “Páginas Coloridas”

Ficou evidenciado que as decisões de montar a própria editora e publicar determinado nicho de títulos está alinhado ao ativismo pela causa LGBTQIAPN+, da qual as mulheres entrevistadas fazem parte. Como editoras independentes, essas mulheres estão mais expostas ao público leitor, uma vez que são as únicas “funcionárias” do empreendimento.

Cada uma das editoras utiliza estratégias específicas e personalizadas no desempenho do papel de mediadoras no ato comunicacional. Na publicização dos livros, elas criam personas para o atendimento ao cliente e a interação nas redes sociais, aceitam convites para eventos, feiras, palestras e seminários. Além disso, dominam e atuam nos canais de comercialização e distribuição dos livros, conquistam reconhecimento, constroem visibilidade positiva junto ao público leitor e as autoras contratadas. Todos esses movimentos objetivam expor as empresas, viabilizar e vender exemplares, o que resulta na formação de um público leitor representativo e uma bibliografia como instrumento de defesa dos Direitos Humanos.

Notas do autor:

[1] “[…] se as notícias acerca do ativismo de gays e lésbicas em outros países ecoaram no Brasil durante a década de 1970 e influenciaram a formação de grupos na Argentina, México e Porto Rico, a repressão dos militares no Brasil se mostrou um grande entrave para a formação de um movimento gay e lésbico” (Trindade, 2018, p. 233).

[2] Ricardo Alexino Ferreira, doutor em Ciências da Comunicação pela ECA-USP, usa o termo sócio-acêntrico para se referir aos segmentos étnico-sociais (afro-brasileiros, homossexuais, mulheres, idosos, entre outros) considerando que são grupos que podem ser melhor entendidos no contexto da neocidadania midiática e que trazem questões de comportamento e cidadania no contexto de protagonização (Ferreira, 2017).

[3] “[…] a interculturalidade significa a relação entre pessoas de distintas culturas e, na verdade, ela se produz desde os inícios da humanidade, à medida que pessoas de culturas diferentes se relacionam ao longo da história” (Maria Aparecida Ferrari, “Comunicação Intercultural: Perspectivas, Dilemas e Desafios”, Comunicação, Interculturalidade e Organizações: Faces e Dimensões da Contemporaneidade, 2015, p. 51).

Referências

FERRARI, M. A. Comunicação Intercultural: Perspectivas, Dilemas e Desafios. In: MOURA, C. P.; FERRARI, M. A. Comunicação, Interculturalidade e Organizações: Faces e Dimensões da Contemporaneidade. Porto Alegre, EDIPUCRS, 2015.

FERREIRA, R. A. O desgaste de termos como “empoderamento” e “protagonismo”. Jornal da USP, São Paulo, 21 ago. 2017. Disponível em: https://jornal.usp.br/?p=109959 . Acesso em: 9 jun. 2025.

TRINDADE, R. A Invenção do Ativismo LGBT no Brasil: Intercâmbios e Ressignificações. In: GREEN, J; QUINALHA, R.; CAETANO, M; FERNANDES, M. (org). História do Movimento LGBT no Brasil. São Paulo, Alameda, 2018.

Adquira o livro em:

FRANCISCO, Alex. Páginas Coloridas: editoras independentes pela diversidade sexual e de gênero. São Paulo: COM-Arte, 2024. Disponível em: https://comarte2024.webhostusp.sti.usp.br/catalogo/paginas-coloridas-editoras-independentes-pela-diversidade-sexual-e-de-genero/ . Acesso em: 10 jun. 2025.

Sobre o autor:

Alex Francisco

Coordenador e professor dos cursos de Design, Fotografia, Jornalismo e Publicidade e Propaganda da Universidade Guarulhos. Professor no Centro Universitário Senac Santo Amaro. Membro acadêmico da Academia Guarulhense de Letras.

Mestre em Ciências da Comunicação pela Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Especialista em Cinema e Linguagem Audiovisual pela Universidade Estácio de Sá e em Marketing Digital e Mídias Sociais pela Universidade de Guarulhos. Bacharel em Comunicação Social – Jornalismo Universidade Guarulhos. Dramaturgo e roteirista formado pelo Centro Universitário Belas Artes e pela Academia Internacional de Cinema.


Redação: Alex Francisco

Fotografia: José Vinicius

Diagramação e Revisão: Alex Sandro Lourenço da Silva

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