Estudo da UFMG promove construção de tesauro para a Justiça de Transição
Estudo da UFMG promove construção de tesauro para a Justiça de Transição
Pesquisa busca a inclusão de grupos marginalizados para criação de um sistema de organização de informação jurídica
Estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) teve como objetivo a construção de um tesauro que aborde a área da Justiça de Transição (JT) de forma mais abrangente, incluindo questões culturais, sociais e políticas. A JT refere-se aos processos de transição de regimes autoritários para regimes democráticos e envolve a busca pela verdade, justiça, reparação e garantia de não repetição de violações dos direitos humanos.
O estudo adota uma abordagem participativa, buscando envolver os atores sociais que atuam na área da JT, como vítimas, ativistas, acadêmicos, profissionais do direito e representantes do Estado. Esses atores são considerados fundamentais para a identificação e representação das terminologias pertinentes à JT.“Um dos principais procedimentos metodológicos utilizados no estudo foi o Grupo Focal, que permite a discussão e validação dos termos e conceitos do tesauro pelos próprios atores da transição democrática. Além disso, foram realizadas pesquisas bibliográficas e documentais para embasar o processo de construção do tesauro”, revelou Pablo Gomes, egresso do curso de doutorado do Programa de Pós Graduação em Ciência da Informação da UFMG e autor do estudo.
Uma parte importante do estudo é a análise do discurso, que se concentra na avaliação dos termos “Ditadura Militar (1964)”, “Regime Ditatorial Militar”, “Justiça” e “Desanistia”. Essa análise busca compreender como esses termos são abordados e interpretados pelos atores sociais envolvidos na JT.
A JT no Brasil surgiu após o fim da Ditadura Militar (1964-1985), um período marcado por violência e violações dos direitos humanos. A transição brasileira foi impulsionada pelos movimentos sociais, especialmente pelas vítimas e seus familiares. No entanto, o processo de JT no país tem sido lento e apresentou retrocessos recentes
“A pesquisa propôs o uso da Ciência da Informação (CI) para contribuir com a JT, especificamente na criação de um tesauro temático. Essa abordagem crítica buscou romper com modelos tradicionais e evitar a reprodução de discursos opressores. O objetivo é promover o acesso à informação e a disseminação da memória e verdade nesse campo complexo”, afirmou Pablo.
Um tesauro é uma ferramenta da Ciência da Informação que organiza e relaciona termos de forma estruturada. Para a recuperação da informação, por ele se estabelecem vinculações entre termos sinônimos, relacionados e hierarquicamente associados. É usado para padronizar e facilitar a pesquisa e a indexação de informações em diferentes áreas.
A pesquisa de Pablo buscou construir um tesauro que desafiasse as opressões sociais e a invisibilidade de grupos marginalizados, além de questionar os discursos hegemônicos presentes na linguagem. Foram utilizados postulados teóricos, como a garantia e a hospitalidade culturais, além de críticas aos princípios positivistas na validação de fontes.
A técnica principal foi o grupo focal, que permitiu a participação de diversos atores sociais da JT, trazendo perspectivas inclusivas e diversificadas. Os resultados mostraram a importância da construção coletiva do tesauro e evidenciaram a influência dos contextos culturais, sociais e políticos nas escolhas terminológicas.
Além do grupo focal, foram utilizados procedimentos de pesquisa bibliográfica e documental para coletar terminologias de fontes tradicionais, como livros, teses, artigos científicos e outros tesauros. Essas fontes foram selecionadas com base na relevância atribuída pelos participantes do grupo focal, buscando representar a área de JT de forma ampla.
A análise do grupo focal e do protótipo do tesauro permitiu compreender a linguagem específica da JT e sua relação com a construção do tesauro como um produto social. Algumas experimentações foram realizadas com o protótipo, explorando termos sinônimos e nomes de pessoas vítimas da ditadura.
Os dados coletados forneceram uma visão abrangente do contexto empírico da pesquisa, relacionando as falas do grupo focal com os termos e relacionamentos do tesauro. A garantia cultural foi central no processo de construção do tesauro, destacando a importância dos atores da transição e dos materiais terminológicos. Um quadro analítico foi desenvolvido com base no referencial teórico e nos marcadores metodológicos utilizados.
“O processo de construção do tesauro para a área de JT considerou as características e especificidades da área, buscando uma representação ampliada e respeitosa das diferenças culturais, sociais e políticas. Um exemplo disso foi a discussão em torno do termo Regime Ditatorial Militar, que foi debatido durante a pesquisa”, disse o autor. A discussão em torno do termo citado é relevante porque dá voz a grupos que poderiam ser invisibilizados no processo de construção de tesauros se apenas fossem consideradas garantias literárias e filosóficas, resultando em uma abordagem acadêmico-científica. Essa possibilidade de invisibilização foi destacada por pesquisadores, que enfatizaram a importância de publicizar a voz de grupos socialmente marginalizados e permitir que eles reescrevam suas histórias.
O tesauro foi construído levando em conta a complexidade da JT e as disputas simbólicas presentes na área. Ele busca promover a verdade e gerar novos conhecimentos sobre a ditadura militar, incluindo termos que seriam silenciados em contextos de negação. Essa abordagem permite um compromisso ético com a verdade, além de uma mudança na organização do conhecimento na área.
Acesse a dissertação em:
GOMES, Pablo. A construção de tesauros em contextos de complexidade cultural, social e política: uma proposta para justiça de transição. 2023. 193 f. Tese (Doutorado em Ciência da Informação) – Escola de Ciência da Informação, Universidade Federal de Minas Gerais Belo Horizonte, Belo Horizonte, 2023. Disponível em: https://repositorio.ufmg.br/handle/1843/57606 . Acesso em: 18 de fevereiro de 2024.
Redação: Vanessa Forte
Revisão: Alex Sandro Lourenço da Silva
Diagramação: Alex Sandro Lourenço da Silva