
Crenças religiosas, políticas e desinformação entre fiéis da Assembleia de Deus – Entrevista com Joilson dos Santos Barros

Crenças religiosas, políticas e desinformação entre fiéis da Assembleia de Deus – Entrevista com Joilson dos Santos Barros
Joilson dos Santos Barros
joilsons@id.uff.br
Em 2025, Joilson dos Santos Barros defendeu sua dissertação pelo Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal do Maranhão, sob orientação da Profa. Dra. Camilla Quesada Tavares.
Joilson é maranhense, jornalista, tem 25 anos e dedica-se integralmente às atividades acadêmicas do doutorado em Comunicação na Universidade Federal Fluminense. E quando consegue tempo, navega pelo TikTok.
Sua dissertação, intitulada “O tensionamento no consumo de notícias: crenças religiosas, políticas e desinformação entre fiéis da Assembleia de Deus em Imperatriz (MA)”, investigou como fiéis da Assembleia de Deus buscam, interpretam e validam informações jornalísticas em meio a disputas político-religiosas. A pesquisa, realizada com 25 entrevistas, testou a recepção de duas matérias (uma verdadeira e outra falsa) e verificou maior aceitação do conteúdo falso quando associado a lideranças político-religiosas. O estudo revela que a confiança na fonte, materializada na figura do líder, opera como critério central de validação, sobrepondo-se à verificação de veracidade e evidenciando os desafios da desinformação no ecossistema de fé e política em Imperatriz.
Divulga-CI: O que te levou a fazer o mestrado e o que te inspirou na escolha do tema da dissertação?
Joilson dos Santos Barros (JB): Desde o primeiro semestre da graduação em Jornalismo na UFMA, tive contato com o grupo de pesquisa Comunicação, Política e Sociedade (COPS), coordenado pela minha ex-orientadora Camilla Tavares. Fiquei fascinado pelo universo da pesquisa social e, com o apoio da professora, consegui uma bolsa remunerada para participar de um projeto maior. Antes de terminar a graduação, já havia sido aprovado no mestrado. Sempre quis investigar, por eu ser evangélico, como minha comunidade se informava, quais canais usavam e como verificam as notícias, especialmente após as eleições de 2018, quando a desinformação eleitoral ficou muito evidente. No geral, é isso, a pesquisa nasce sempre de uma inquietação nossa. O pesquisador nunca é alguém neutro, sempre vai partir de um ponto de vista.
DC: Quem será o principal beneficiado dos resultados alçados?
JB: Essa é uma pergunta interessante, mas confesso que um pouco frustrante para mim como pesquisador. Minha dissertação trouxe resultados importantes que podem ajudar a combater a desinformação entre os evangélicos, identificando fatores que os tornam mais suscetíveis a fake news. No entanto, por falta de recursos e tempo, não foi possível criar um manual ou retornar às igrejas para apresentar esses dados. Essa questão do retorno ao público pesquisado é um tema importante e discutido nas universidades, mas nem tudo depende só do pesquisador.
DC: Quais as principais contribuições que destacaria em sua dissertação para a ciência e a tecnologia e para a sociedade?
JB: Eu diria que minha dissertação é quase única, pois poucas pesquisam com profundidade como os evangélicos realmente consomem informação. Já existem estudos sobre quais meios eles usam, mas nosso diferencial foi fazer um experimento para entender na prática como eles interpretam uma notícia. Isso mostrou que quem consome mais mídias partidárias e opinativas tende a ser mais vulnerável à desinformação. Ou seja, o estudo ajuda a mostrar para a sociedade essa relação entre o tipo de mídia consumida e a facilidade em acreditar em fake news.
DC: Seu trabalho está inserido em que linha de pesquisa do Programa de Pós Graduação? Por quê?
JB: Meu trabalho está inserido na linha de pesquisa Comunicação e Processos Sociopolíticos porque ele investiga como a comunicação, especialmente o consumo de notícias, está ligada a questões políticas e sociais. Acredito que a desinformação que circula entre evangélicos quase sempre envolve um fundo político ou moral, o que faz com que esse grupo se mobilize na sociedade para proteger seus interesses e agendas.
DC: Citaria algum trabalho ou ação decisiva para sua dissertação? Quem é o autor desse trabalho, ou ação, e onde ele foi desenvolvido?
JB: Uma referência decisiva para minha dissertação foi o artigo “Prevalência e fatores associados à hesitação vacinal contra a COVID-19 no Maranhão, Brasil”, de Bruno Oliveira, da UFMA. Esse estudo trouxe dados importantes sobre a hesitação vacinal no Maranhão, mostrando que evangélicos estão entre os grupos com maior resistência à vacina. Isso ajudou a contextualizar minha pesquisa, cujo diferencial foi aplicar um experimento usando notícias, incluindo uma falsa associação promovida pelo deputado Nikolas Ferreira, para entender como esse grupo interpreta e aceita desinformação sobre a vacina.
DC: Quais foram os passos que definiram sua metodologia de pesquisa?
JB: Para realizar a pesquisa, escolhemos conversar com membros da Assembleia de Deus em Imperatriz, Maranhão, grupo religioso grande e importante na cidade. Fizemos 25 entrevistas com pessoas de diferentes idades, desde jovens até idosos. As entrevistas tiveram três partes principais: primeiro, perguntamos sobre o relacionamento delas com a igreja e seus líderes; depois, sobre como elas consomem notícias e quais meios de comunicação usam; por fim, mostramos uma notícia falsa ligada às vacinas e à morte de um cantor gospel para saber o que elas pensavam sobre isso. Com essas respostas, analisamos os temas mais comuns para entender como eles buscam e interpretam as informações, mostrando também como a lealdade aos líderes influencia suas opiniões.
DC: Quais foram as principais dificuldades no desenvolvimento e escrita da dissertação?
JB: A principal dificuldade para mim foi o tempo, porque dois anos passam rápido demais e tem a pressão de procurar outra fonte de renda quando a bolsa está perto do fim. Além disso, a escrita é um processo solitário e cansativo: você precisa passar muito tempo lendo, organizando ideias, fazendo anotações e escrevendo várias partes do trabalho, como introdução, capítulos teóricos, metodologia, análise dos dados e conclusões. Tem dias que a gente se sente perdido, como numa crise existencial acadêmica, porque é difícil manter o foco e escrever um texto que faça sentido e seja claro.
DC: Em termos percentuais, quanto teve de inspiração e de transpiração para fazer a dissertação?
JB: É difícil dizer exatamente em termos de porcentagem quanto foi inspiração e quanto foi transpiração na minha dissertação. Posso afirmar que o processo exigiu muito esforço diário, dedicação, leitura e escrita constante — o que seria a transpiração —, mas também momentos importantes de motivação, ideias e descobertas que impulsionaram o trabalho — a inspiração.
DC: Teria algum desabafo ou considerações a fazer em relação à caminhada até a defesa e o sucesso da dissertação?
JB: Foi um processo muito difícil, cheio de altos e baixos. Mas sou grato por ter tido uma orientadora muito paciente e que me guiou bem durante essa jornada. Acho importante dizer que não é verdade que dá para fazer tudo em dois anos se você tiver esforço [duvide desse tipo de discurso]; escrever uma dissertação é muito trabalhoso e exige muita dedicação. Muitas vezes passei horas e horas sentado em frente ao computador, abrindo mão de momentos com a família e amigos para conseguir dar conta do trabalho. No fim, a sensação de dever cumprido compensa todo esse esforço. Mas, não posso e nunca vou romantizar esse processo.
DC: Como foi o relacionamento com a família durante este tempo?
JB: No meu caso, só consegui avançar de verdade quando voltei para minha cidade natal, onde tinha mais conforto, comida pronta feita pela minha mãe e um ambiente mais tranquilo para ler e escrever. Na reta final (entenda como o último semestre), até deixei de ir com tanta frequência para a academia justamente para dedicar mais tempo à dissertação, mas o apoio da família foi o que realmente fez a diferença para não desistir. Ou seja, se eu estivesse na cidade que reside o PPGCOM, teria sido bem mais sofrido a minha reta final.
DC: Agora que concluiu a dissertação, o que mais recomendaria a outros mestrandos que tomassem seu trabalho como ponto de partida?
JB: Recomendaria que outros mestrandos usem meu trabalho como ponto de partida para aprofundar a pesquisa sobre como grupos específicos, como os evangélicos, consomem e interpretam informações. Também sugiro que explorem mais a relação entre desinformação, política e cultura religiosa, porque são temas muito atuais e importantes. Além de tudo, inovem nos métodos, façam experimentos.
DC: Como você avalia a sua produção científica durante o mestrado? Já publicou artigos ou trabalhos resultantes da pesquisa? Quais você aponta como os mais importantes?
JB: Durante o mestrado, consegui publicar o artigo “O Templo também é lugar de fazer política: um estudo a partir das caravanas ‘Juventude pelo Brasil’ durante as Eleições de 2022”, na revista Comunicação e Sociedade, junto com minha orientadora. Antes de publicar, participei de vários eventos, como a ANPOCS, que foram fundamentais para aprimorar as contribuições teóricas e metodológicas do artigo. Considero esse trabalho o mais importante da minha produção até agora.
DC: Desde a conclusão da dissertação, o que tem feito e o que pretende fazer em termos profissionais?
JB: Desde a conclusão da dissertação, segui para o doutorado em Comunicação. Contudo, não pretendo continuar estudando a desinformação entre evangélicos, pois não me sinto mais atraído por essa linha de pesquisa e quero explorar novos rumos na minha trajetória acadêmica e profissional. Ainda estou descobrindo o que quero pesquisar no doutorado.
DC: Pretende fazer doutorado? Será na mesma área do mestrado?
JB: Sim, já ingressei no doutorado. Foi uma surpresa incrível: no dia da minha defesa de mestrado, recebi a notícia de que tinha passado no doutorado. Na verdade, eu estava na lista de espera, mas consegui uma vaga. Agora estou em um dos melhores Programas de Pós-Graduação em Comunicação do país, avaliado com nota máxima pela CAPES, nota 7.
DC: O que faria diferente se tivesse a chance de ter começado sabendo o que sabe agora?
JB: Se eu pudesse começar de novo sabendo o que sei hoje, não me pressionaria tanto para acelerar tudo. Acho que seguiria o meu próprio ritmo, com mais calma e realismo, dando prioridade à minha saúde mental. Entendi que não vale a pena se cobrar demais por causa de um título, porque o importante é aprender e crescer, não a rapidez com que a gente conclui. Aprendi que cuidar do bem-estar durante a jornada é fundamental para conseguir fazer um bom trabalho. Eu li um dia desses uma frase que diz: “Você não precisa chegar primeiro. Você precisa chegar inteiro”. É isso. Espero que algum mestrando ou doutorando possa ler isso também.
DC: O que o Programa de Pós-Graduação fez por você e o que você fez pelo Programa nesse período de mestrado?
JB: Durante o mestrado, cumpri as atividades previstas, como participar das disciplinas, colaborar nos eventos, desenvolver a pesquisa e apresentar trabalhos em congressos nacionais e internacionais. O que mais destaco que o Programa fez por mim foi fomentar um olhar cuidadoso para minha pesquisa, oferecendo apoio prático e teórico, como indicações de literatura relevante e o empréstimo de livros, exemplo disso foi a atenção da professora Izani Mustafá. Além disso, ressalto a qualidade dos professores, em especial a professora Thaisa Bueno, que organiza a banca de pré-qualificação na disciplina Seminários da Dissertação, demonstrando o cuidado do Programa com a formação e avanço do pesquisador.
DC: Você por você:
Nome: No fundo, sou só alguém querendo me tornar um bom pesquisador e ter sucesso na área.
Entrevistada: Joilson dos Santos Barros
Entrevista concedida em: 1 de setembro de 2025
Formato de entrevista: Escrita
Redação da Apresentação: Iasmim Farias Campos Lima
Fotografia: Joilson dos Santos Barros
Diagramação: Ana Júlia Pereira de Souza









