
Entrevista com Laelson da Silva sobre sua pesquisa que analisou as ecologias informacionais em Centros de Referência LGBTQIA+

Entrevista com Laelson da Silva sobre sua pesquisa que analisou as ecologias informacionais em Centros de Referência LGBTQIA+
Laelson Felipe da Silva
laelsonfelipesilva@gmail.com
Sobre o entrevistado
O recém doutor Laelson Felipe da Silva defendeu, em 2023, sua tese de doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba, sob orientação do Prof. Dr. Henry Poncio Cruz de Oliveira.
Natural de João Pessoa, Paraíba, Laelson tem como hobbies fazer trilhas ecológicas e realizar pequenos projetos de marcenaria artesanal. No âmbito profissional, atua como contador na Duo Contabilidade Digital.
Sua tese, intitulada “Ecologias Informacionais Complexas em Centros de Referência LGBTQIA+ No Brasil”, analisa os Centros de Referência de Direitos Humanos LGBTQIA+ no Brasil, tanto seus espaços físicos quanto digitais. E apresenta um modelo que contempla suas estruturas como elementos que compõem ecologias informacionais complexas e que visa promover a otimização do acesso e uso de seus serviços. Concluiu-se que esses centros têm potencial para se desenvolverem como ecologias informacionais complexas com o uso adequado de tecnologias e que isto promoverá o acesso à informação de forma mais ampla e mais democrática.
Laelson nos conta, nesta entrevista, como se deu o desenvolvimento de sua pesquisa, suas perspectivas e experiências no programa de doutorado.
Divulga-CI: O que te levou a fazer o doutorado e o que te inspirou na escolha do tema da tese?
Laelson Silva (LS): A educação sempre me foi apresentada como um elemento catalisador de transformações sociais, nesse sentido, estive em busca de formação educacional para obter estas mudanças positivas em minha vida. Foi assim, que fui do ensino médio ao doutorado. A escolha do tema foi uma consequência do meu encontro com minha orientadora do mestrado, Gisele Cortês, ela me apresentou os centros de referências e eu fiquei maravilhado com o potencial informacional desses centros. Assim, expandi a pesquisa no doutorado de modo a analisar aspectos mais abrangentes dos centros a partir do olhar da Arquitetura da Informação
DC: Em qual momento de seu tempo no doutorado você teve certeza que tinha uma “tese” e que chegaria aos resultados e conclusões alcançados?
LS: Acredito que na qualificação, no final do segundo ano do doutorado, já havia uma perspectiva positiva em relação ao “nascimento” da tese. Quando a banca de qualificação apresentou suas observações sobre o projeto soube que a tese estava no caminho certo, que conceitualmente ela já existia. Agora, ter certeza de que obteria os resultados e as conclusões que obtive só foi possível no início do quarto ano.
DC: Citaria algum trabalho (artigo, dissertação, tese) ou ação decisiva para sua tese? Quem é o autor desse trabalho, ou ação, e onde ele foi desenvolvido?
LS: O estudo intitulado Arquitetura da informação pervasiva no contexto do Centro Estadual de Referência dos Direitos de LGBT e enfrentamento à LGBTfobia na Paraíba, foi um dos estudos mais decisivos para o desenvolvimento de minha tese. Seu autor foi um colega de mestrado, o Me. Michel Batista Silva. A dissertação permitiu realizar um melhor direcionamento em relação aos elementos constitutivos dos centros que abordei no meu estudo. A dissertação citada foi desenvolvida no Programa de Pós Graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal da Paraíba, mesmo centro no qual obtive o título de mestre e doutor.
DC: Por que sua tese é um trabalho de doutorado, o que você aponta como ineditismo?
LS: O ineditismo do meu trabalho e o que o qualifica como uma tese, deve-se à descoberta dos Centros de referência enquanto Ecologias Informacionais Complexas apresentando seus elementos essenciais à medida que relaciona as contribuições de cada centro de modo a estruturar um modelo com aplicações em âmbito nacional. Estudos anteriores analisaram elementos relacionados a Arquitetura da Informação, Mediação da Informação, Informação e Cultura em âmbito local, em estados como Paraíba e São Paulo.
DC: Em que sua tese pode ser útil à sociedade?
LS: O estudo que desenvolvi pode orientar gestores públicos a estruturar os Centros de modo a otimizar a sua estrutura física e/ou digital à medida que apresenta um modelo de Arquitetura Informacional resultando de um apanhado de experiências bem sucedidas ligadas aos serviços essenciais oferecidos em Centros de todo o país. O modelo foi aperfeiçoado mediante elementos relacionados à Ciência da Informação, com o objetivo de promover melhor organização, acesso e uso de tudo quanto é produzido e disponibilizado nesses locais.
DC: Quais são as contribuições de sua tese? Por quê?
LS: No âmbito científico, a tese trouxe novos elementos a serem considerados no desenvolvimento de estudos no campo da Ciência da Informação sobre os Centros de Referência, sobretudo na sua compreensão de seus ambientes enquanto ecologias informacionais complexas. No ponto de vista social a tese contribuiu para uma melhor visão do panorama geral da distribuição dos centros de referência no Brasil, os dados relativos aos centros são ricos e podem ser utilizados para orientar políticas públicas e otimizar o uso de tecnologias para aperfeiçoar seus serviços e atendimento.
DC: Quais foram os passos que definiram sua metodologia de pesquisa?
LS: O primeiro elemento que orientou o estudo foi a delimitação do problema/objeto, para isso foi realizado um levantamento bibliográfico sobre o que se havia produzido sobre Centros de Referência no Brasil para compreender suas características. Paralelamente, aprofundei-me nos estudos das temáticas relacionadas a Arquitetura da Informação em busca de levantar categorias que me fornecessem ferramentas necessárias para as etapas seguintes. Ao fim do levantamento bibliográfico, consegui desenvolver hipóteses a respeito do problema/objeto, também já havia definido qual o instrumento de coleta de dados e levantado categorias analíticas.
DC: Em termos percentuais, quanto teve de inspiração e de transpiração para fazer a tese?
LS: Se fosse possível mensurar de forma objetiva, eu diria que 70% foi transpiração e o restante, 30%, foi inspiração. Não gosto muito de mensurar assim, acredito que não há uma medida exata para esse tipo de coisa, mas percebo que a inspiração não é algo que surge do nada, é um trabalho invisível e surpreendente que nosso cérebro faz a partir de tudo quanto nós absorvemos. É preciso ler muitas coisas e refletir muito sobre tudo que foi visto até que a inspiração chegue.
DC: Teria algum desabafo ou considerações a fazer em relação à caminhada até a defesa e o sucesso da tese?
LS: Há muitas ideias cristalizadas que se desenvolveram a partir de trajetórias que não foram muito felizes. Essas ideias acabam sendo propagadas como verdades inerentes à trajetória na pós-graduação e influenciam negativamente o acesso, o desenvolvimento pessoal e acadêmico de estudantes tanto de mestrado quanto de doutorado. Seria interessante que os propagadores dessas ideias ou práticas refletissem sobre como isto pode ser negativo para o desenvolvimento da ciência como um todo.
DC: Como foi o relacionamento com a família durante o doutorado?
LS: É difícil para muitas pessoas compreender que as atividades desenvolvidas no mestrado e no doutorado são de fato um trabalho e necessitam de muito tempo e dedicação para que se chegue ao fim desejado. Com minha família não foi diferente, no início do mestrado foi um pouco difícil explicar e ser compreendido, mas ao longo do doutorado percebi que já havia um entendimento melhor sobre como as atividades da pós funcionam no cotidiano de um pesquisador.
DC: Qual foi a maior dificuldade de sua tese? Por quê?
LS: A maior dificuldade foi definir o modelo de ecologia informacional complexa, um dos objetivos do estudo, a partir da análise de Centros tão diversos. Compreender quais elementos eram essenciais e deveriam ser replicados ou quais estruturas necessitam de aperfeiçoamento foi desafiador. E fazer isso em meio a um processo de renovação conceitual do que seria a Arquitetura da Informação Pervasiva me deixou inseguro a respeito da conclusão do estudo.
DC: Que temas de mestrado citaria como pesquisas futuras possíveis sobre sua tese?
LS: Os desdobramentos que acredito serem interessantes dizem respeito à replicação do estudo em outros tipos de serviços públicos ou à aplicação do modelo proposto em um projeto de desenvolvimento de Centro de Referência. Desse modo teríamos:
Análise da Arquitetura da Informação em Centro de Referência X;
Aplicação do Modelo de Ecologia Informacional Complexa em Centro de Referência Y.
DC: Quais suas pretensões profissionais agora que você se doutorou?
LS: Minhas pretensões profissionais giram em torno da docência. Seria o fechamento de um grande ciclo, a realização de um sonho chegar à docência no ensino superior e contribuir para formação de outros profissionais, mestres e doutores.
DC: O que faria diferente se tivesse a chance de ter começado sabendo o que sabe agora?
LS: Eu teria buscado mais ajuda ainda, teria compartilhado meu trabalho e ideia com mais amigos próximos e com colegas do contexto acadêmico. Tive essa oportunidade no mestrado, mas no doutorado, com a pandemia, o contato com outros colegas que estavam também desenvolvendo seus estudos foi dificultado. Compartilhar ideias e conversar sobre as minhas dificuldades na pesquisa com os colegas do mestrado me ajudou muito a encontrar soluções que eu sozinho não estava enxergando, ajudou-me também na produção de artigos e outras publicações.
DC: Como você avalia a sua produção científica durante o doutorado (projetos, artigos, trabalhos em eventos, participação em laboratórios e grupos de pesquisa)? Já publicou artigos ou trabalhos resultantes da pesquisa? Quais você aponta como os mais importantes?
LS: Minha produção durante o doutorado não foi tão vasta, resolvi focar minhas energias nos aprofundamentos necessários ao desenvolvimento do estudo da tese. Mas mesmo assim, consegui produzir alguns artigos e capítulos de livro que envolveram a temática abordada no mestrado e elementos da pesquisa do doutorado devido ao objeto ser semelhante nos dois casos.
DC: Exerceu alguma monitoria/estágio docência durante o doutorado? Como foi a experiência?
LS: Sim, exerci. Fiz estágio docente tanto no mestrado quanto no doutorado. Foi uma ótima experiência. Indico a todas as pessoas que, se tiverem essa possibilidade, não hesitem em aceitá-la, é uma preparação para o futuro daquelas pessoas que almejam a carreira docente.
DC: Elas contribuíram em sua tese? De que forma?
LS: Sim. Contribuiram com o desenvolvimento das minhas habilidades interpessoais, o que foi importante para lidar com as diversas pessoas com as quais eu entrei em contato pessoal ou remotamente e que contribuíram com a execução do estudo. Cada discente em sua perspectiva de mundo me enriqueceu com uma experiência ímpar que me fez ver ainda mais o quanto o mundo é diverso e plural.
DC: Agora que concluiu a tese, o que mais recomendaria a outros doutorandos e mestrandos que tomassem seu trabalho como ponto de partida?
LS: A tese enquanto trabalho pronto oculta muitos detalhes que não são evidenciados de maneira explícita, mas é preciso compreender que nela há muitos elementos que tornaram do pesquisador um doutor. Desse modo, no meu estudo há alguns pontos metodológicos e resultados interessantes a serem observados por aqueles que tiverem acesso ao estudo, mas tudo deve ser analisado com olhar generoso de modo que cada pesquisador compreenda sua realidade e limitações.
DC: Como acha que deve ser a relação orientador-orientando?
LS: Deve ser uma relação leve e de comunicação fluida. O trabalho de desenvolvimento de um estudo como uma tese demanda muita energia e passa por momentos tensos nos quais suas próprias habilidades serão postas à prova por você mesmo, na maioria das vezes. Desse modo, ter alguém que possa ouvir suas preocupações e te direcionar nesses momentos é imprescindível para que você não se desvie do seu objetivo. Uma comunicação truncada sem fluidez dificulta essa troca e pode tornar o trabalho mais difícil do que deveria ser. Certamente, a tese é um trabalho que você vai precisar desenvolver a partir de suas próprias habilidades e dedicação, mas contar com um orientador presente vai ajudar muito.
DC: Sua tese gerou algum novo projeto de pesquisa? Quais suas perspectivas de estudo e pesquisa daqui em diante?
LS: Ainda não, espero poder desenvolver algum projeto no futuro, gosto muito da temática com a qual trabalhei e vejo que há potencial para desenvolvimento de trabalhos que podem colaborar para a expansão do tema.
DC: O que o Programa de Pós Graduação fez por você e o que você fez pelo Programa nesse período de doutorado?
LS: O Programa sempre foi muito solícito em relação às demandas apresentadas. Os coordenadores e secretários sempre estiveram em contato comigo para tratar das questões ligadas aos prazos, auxílios e etc.
DC: Você por você:
LS: Vim de um contexto muito simples no qual a educação era a única forma de transformar minha vida. Assim, cresci sabendo que era preciso estudar para ser alguém, isso não foi um sacrifício, desde criança sempre fui muito curioso sobre tudo que envolvia as mais variadas ciências. Quando entrei no mestrado soube que seria possível trabalhar com a comunidade LGBTQIA+ e isso fez com que ficasse muito feliz em desenvolver uma ciência posicionada cujos resultados teriam potencial para alcançar pessoas LGBTQIA+.
Entrevistada: Laelson Felipe da Silva
Entrevista concedida em: 27 mar. 2024 aos Editores.
Formato de entrevista: Escrita
Redação da Apresentação: Herta Maria de Açucena do Nascimento Soeiro
Fotografia: Laelson Felipe da Silva
Diagramação: Herta Maria de Açucena do Nascimento Soeiro