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v. 1, n. 6, ago. 2023
Como catalogar e atribuir assuntos aos Quadrinhos?

Como catalogar e atribuir assuntos aos Quadrinhos?

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Como catalogar e atribuir assuntos aos Quadrinhos?

Pesquisadora analisa a contemporaneidade da descrição física e temática das Histórias em Quadrinhos em bibliotecas brasileiras

Nos últimos meses, circularam nos fóruns digitais, e, certamente, fora deles, inúmeras discussões sobre a categorização de História em Quadrinhos (HQ) enquanto um gênero literário, se ele era ou não literatura. A repercussão desse assunto ocorreu devido à fala do jornalista brasileiro James Akel, que, segundo ele, “Gibi não é literatura”. A partir dessa fala, poderíamos discutir longamente acerca dos aspectos que diferenciam o Gibi da HQ, ou mesmo as Graphic Novels, termo cunhado para as HQ’s ainda mais sofisticadas e profundas.

 Enquanto bibliotecários, não nos implica a discussão literária sobre a importância das histórias em quadrinhos enquanto gênero literário. Essa categoria de material existe e deve continuar a integrar os acervos das bibliotecas, sobretudo as públicas de bairro e escolares. Evidentemente que isso não significa que não devemos nos ater às discussões que ocorrem no universo das Letras, campo tão próximo ao nosso. Muito pelo contrário, é dever nosso estar a par dos conteúdos e conhecer minimamente a forma que os especialistas desses campos caracterizam as peças que fazem parte de acervos de bibliotecas ou de outras unidades de informação.

Por outro lado, nosso papel, enquanto mediadores e gestores da circulação da informação, isto é, salvaguardar e difundir os conteúdos presentes nos mais variados suportes de tal forma que estes mesmos suportes, bibliográficos ou audiovisuais, cheguem àqueles que se interessarem por eles, nos diz que se em uma biblioteca há leitores interessados em uma ou mais história em quadrinhos, é missão da biblioteca possuir esse material e difundi-lo em sua comunidade. 

A partir dessa premissa, e, identificando a necessidade de os bibliotecários saberem trabalhar com história em quadrinhos como material de tanta importância quanto quaisquer outros, Ida Conceição Andrade de Melo, agora Mestra em Ciência da Informação, apresentou um belo trabalho ao Programa de Pós-graduação em Ciência da Informação da Universidade Federal de Sergipe no último ano. 

Em sua dissertação de mestrado, intitulada “A primeira gibiteca pública sergipana: manual de catalogação de acervos de histórias em quadrinhos”, Ida perguntou-se como organizar e descrever um acervo de HQ, tendo em vista as especificidades da relação entre forma e conteúdo. 

No trabalho, foram observados os processos e procedimentos tanto de análise física como também temática das HQ, ou seja, foi questionado não apenas como os bibliotecários deveriam descrever as obras, no que diz respeito aos atributos de título, autoria e outros dados da publicação, mas também como atribuir assuntos e classificações para essas publicações. 

Quanto aos procedimentos metodológicos, para a pesquisa ser executada, foram elencados a revisão de bibliografia e o estudo de caso do tratamento documental realizado com as HQ pela Biblioteca Pública Estadual Epiphânio Dória, localizada na cidade de Aracaju, estado de Sergipe. Para o recorte temporal do levantamento bibliográfico, definiu-se dez anos, de 2011 a 2021, o que proporcionou uma leitura contemporânea do tema. 

O resultado da pesquisa não poderia ser outro que não uma pintura do estado atual da catalogação de HQ realizada por bibliotecários no Brasil. Após um extenso levantamento bibliográfico e, da mesma sorte, análise de ações e textos biblioteconômicos, foi entregue como produto da pesquisa, além da própria dissertação, um manual para bibliotecários tomarem como base para trabalhar com o tipo de publicação pesquisada por Ida. 

A autora inicia seu texto chamando atenção do leitor para a definição da unidade de informação que trata de HQ e materiais afins. A gibiteca, como pontuado no texto, trata-se de um particular departamento de uma biblioteca que possui HQ, gibis e materiais semelhantes. Na cidade de São Paulo, por exemplo, há a Gibiteca Henfil, que faz parte do Centro Cultural São Paulo. A gibiteca leva o nome do já falecido especialista em ilustração e produção de história em quadrinhos Henrique de Souza Filho, mais conhecido como Henfil. Ainda, é destacado pela pesquisadora que gibiteca pode ser uma unidade autônoma, ou seja, não precisa, necessariamente, fazer parte de uma outra instituição mantenedora. Um exemplo é a Gibiteca de Santa Catarina, inaugurada em 1982.

As justificativas para essa pesquisa poderiam ser várias, mas podemos começar por: bibliotecários sabem trabalhar com texto e imagem numa mesma publicação, levando em conta apenas se ela é ilustrada ou não? A questão que importou para a pesquisadora é a de que, diante da intrínseca relação entre texto e imagem das HQ, os bibliotecários não podem desconsiderar a narrativa — a estória ali contada pelo autor — que também pode ser ilustrador, da mesma forma que este também é autor independentemente da outra pessoa autora somente do texto escrito

Significativa contribuição desse estudo de Ida é a apresentação de uma cronologia das pesquisas realizadas sobre o tema HQ no Brasil. Sabemos pela leitura do trabalho que em 1967 foi realizada a primeira pesquisa acadêmica sobre o assunto, por estudantes da graduação em Comunicação da Faculdade Cásper Líbero, em São Paulo. 

No início da década seguinte, foram ofertadas as primeiras disciplinas em cursos de graduação, respectivamente, na Universidade de Brasília e na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Nesta mesma escola, em 1999, Waldomiro Vergueiro, bibliotecário e professor aposentado, criou o Núcleo de Pesquisas em Histórias em Quadrinhos. Hoje, como professor sênior, ele ainda dá aulas sobre o assunto no Departamento de Editoração e Jornalismo. 

Consagrou-se, assim, o tema da HQ na pesquisa acadêmica brasileira.

No campo das bibliotecas, as HQ’s são tratadas seguindo as regras de catalogação de materiais bibliográficos. Logo, os metadados que os bibliotecários buscam preencher nas planilhas de catalogação são os mesmos atribuídos aos livros. Ida nos mostra que tal procedimento retira da HQ o seu conjunto específico de valores informacionais e culturais. A partir da Classificação Decimal de Dewey (CDD), por exemplo, utiliza-se o número 741.5. Assim, todos exemplares de HQ de uma biblioteca ficariam juntos na mesma estante, independentemente do público ser homogêneo ou não. 

Na prática, isso significa que crianças e adultos poderiam se deparar com a mesma estante que contém “Sandman” e “Turma da Mônica”. Para além da discussão sobre o que uma pessoa da idade x ou y pode ler ou deixar de ler, a organização de uma biblioteca importa de tal modo que o seu público enxergue pelas prateleiras uma organicidade, e seja apresentado aos materiais levando em conta o seu conteúdo, e não apenas a sua “forma”.

Com essas questões, Ida nos mostra diversos trabalhos de gibitecas brasileiras que, por parte dos seus bibliotecários, houve esforços para pensar formas de descrever e disseminar as HQ’s, e, a partir destes trabalhos, um manual de tratamento informacional foi realizado, levando em conta as demais categorias e assuntos que podem haver em uma história em quadrinhos, como terror, aventura, humor etc. Certamente, esse manual pode ser um ponto de partida para outros trabalhos de bibliotecários Brasil adentro que ainda buscam especializar-se no emprego de práticas de descrição dessa peça literária importantíssima.

Acesse a dissertação em:

MELO, Ida Conceição Andrade de. A primeira gibiteca pública sergipana: manual de catalogação de acervos de histórias em quadrinhos. 2022. 123 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Gestão da Informação e do Conhecimento) – Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, 2022. Disponível em: http://ri.ufs.br/jspui/handle/riufs/16784 . Acesso em 05 ago. 2023. 


Redação: Alex Sandro Lourenço da Silva

Revisão: Herta Maria de Açucena do Nascimento Soeiro

Diagramação: Herta Maria de Açucena do Nascimento Soeiro

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