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v. 1, n. 5, jul. 2023
Entrevista com Nivaldo Calixto Ribeiro sobre sua pesquisa com as ações relacionadas à Ciência Aberta nas universidades públicas federais

Entrevista com Nivaldo Calixto Ribeiro sobre sua pesquisa com as ações relacionadas à Ciência Aberta nas universidades públicas federais

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Entrevista com Nivaldo Calixto Ribeiro sobre sua pesquisa com as ações relacionadas à Ciência Aberta nas universidades públicas federais

Nivaldo Calixto Ribeiro

nivaldo@ufla.br

Sobre o entrevistado

Em 2022, o recém doutor Nivaldo Calixto Ribeiro finalizou seu doutorado pelo Programa de Pós-Graduação em Gestão & Organização do Conhecimento, da Universidade Federal de Minas Gerais, sob orientação da Prof.ª Dr.ª Dalgiza Andrade Oliveira.

Natural de Formiga, Minas Gerais, Nivaldo é bibliotecário documentalista e tem como hobbies ouvir música e assistir séries. Atualmente, é bibliotecário da Universidade Federal de Lavras, trabalhando no setor de Repositório Institucional.

Sua tese, intitulada “Ciência Aberta em universidades públicas federais brasileiras: políticas, ações e iniciativas” buscou identificar quais ações relacionadas à Ciência Aberta estão sendo desenvolvidas em universidades públicas federais brasileiras. As universidades caminham em direção à Ciência Aberta, embora tenha sido constatada a necessidade de avanços institucionais e de uma legislação governamental mais vigorosa para sua consolidação. Além disso, foram apresentados três produtos da investigação: uma proposta de criação de Agência de Ciência Aberta dentro das universidades para assessorá-las nesse tema; uma aplicação web para autoavaliação da Aderência à Ciência Aberta e o canal de divulgação científica Ciência da Informação Express (CIExpress)

Convidamos Nivaldo a nos relatar, nesta entrevista, sua experiência com o doutoramento, os desdobramentos de sua pesquisa e perspectivas futuras.

Divulga-CI: O que te levou a fazer o doutorado e o que te inspirou na escolha do tema da tese?

Nivaldo Ribeiro (NR): Diversos motivos podem ser citados, entre eles a necessidade da implantação de uma cultura voltada para a abertura da ciência na minha instituição de vínculo, participação em diversos eventos, com destaque para a Conferência SciELO 20 anos, em 2018, entre outros que abordaram a Ciência Aberta.  Um outro fato inspirador foi ter assistido ao filme “O Óleo de Lorenzo”, um comovente roteiro cinematográfico que apresenta verdadeiro aprendizado para aqueles que o assistem, que enquadra algumas facetas relacionadas à importância de pesquisas mais transparentes e eficientes.

DC: Em qual momento de seu tempo no doutorado você teve certeza que tinha uma “tese” e que chegaria aos resultados e  conclusões alcançados?

NR: Quando atendi às diversas recomendações da banca de qualificação do projeto. As ponderações, as críticas e limitações apresentadas foram incrivelmente oportunas para delimitar a investigação e estabelecer proposições exequíveis.

DC: Citaria algum trabalho (artigo, dissertação, tese) ou ação decisiva para sua tese? Quem é o autor desse trabalho, ou ação, e onde ele foi desenvolvido?

NR: Três publicações foram importantes para a minha pesquisa: Albagli (2015), que apresenta o embate entre distintas formas de apropriação do conhecimento, o privado e o aberto. Essa publicação me  proporcionou várias reflexões sobre como a ciência é produzida e como interesses obscuros espreitam um “nicho de mercado” que surgiu sorrateiramente para se aproveitar das práticas de Ciência Aberta, levantando a bandeira da transparência e da democracia científica. A taxonomia da Ciência Aberta proposta por Pontika et al. (2015), que tornou-se a espinha dorsal da revisão narrativa da literatura da tese, acompanhada das cinco escolas de pensamento apresentadas na revisão de literatura de Fecher e Friesike (2014). Um detalhe importante é que tive a oportunidade de entrevistar Nancy Pontika (2021) e Benedit Fecher (2022), ambas as entrevistas disponíveis no canal de divulgação científica Ciência da Informação Express (CIExpress), um dos produtos da tese. Outro fato decisivo foi a participação no estudo de Silveira et al. (2021), que envolveu 13 pesquisadores especialistas na temática sobre Ciência Aberta em geral ou em algumas de suas facetas, os quais cooperaram na proposta de inclusão de novos termos da taxonomia, bem como a validação e sugestões de novos recursos e conceitos na tradução livre realizada, inicialmente, por mim, Sarah Rúbia de Oliveira dos Santos e a Lúcia da Silveira, a qual coordenou o estudo que propôs uma nova taxonomia. Com essa ação, foi possível aprofundar o conhecimento necessário para desenvolver a pesquisa. Além disso, a partir desse estudo, gerou-se uma nova ação com um grupo de pesquisadores da América Latina e Espanha, com reuniões semanais, para compreender o ecossistema da Ciência Aberta, revisando as taxonomias de Pontika et al. ( 2015) e de Silveira et al. (2021), juntamente com as recomendações da Unesco sobre esse assunto para propor, em breve, uma nova taxonomia.

DC: Por que sua tese é um trabalho de doutorado, o que você aponta como ineditismo?

NR: Além da pesquisa documental, com os resultados, foram apresentados três produtos, que podem ser considerados inovadores: a proposta de criação de uma Agência de Ciência Aberta, com a finalidade de dar suporte às universidades federais sobre o tema; a apresentação de como foi a implantação e a forma de atuação do canal de divulgação científica Ciência da Informação Express (CIExpress) e, por último, uma aplicação web para avaliação da aderência à Ciência Aberta por universidades públicas federais brasileiras ou qualquer outra instituição que desenvolve pesquisa.

DC: Em que sua tese pode ser útil à sociedade?

NR: Entendo que foram expostas estratégias e ações que podem fortalecer os mecanismos de preservação da memória institucional da pesquisa científica vinculada a universidades públicas federais, aumentar o debate sobre o acesso à informação científica, demonstrar possíveis formas de aproximação das universidades à comunidade em geral, contribuir com o diálogo voltado para as intenções de popularização e socialização da ciência, além de trazer reflexões sobre possíveis impactos de projetos científicos, por meio de evidências de Ciência Aberta e Ciência Cidadã.

DC: Quais são as contribuições de sua tese? Por quê?

NR: Além das reflexões relacionadas à Ciência Aberta, a tese instiga o surgimento de novas perguntas de pesquisa para a área de comunicação científica, alinhadas aos objetos de estudos da Ciência da Informação. Ainda, creio que os três produtos apresentados têm potencial para auxiliar na orientação de instituições que buscam o caminho da concretização de posturas, iniciativas e atitudes voltadas para as práticas de ciência aberta em suas diretrizes. 

DC: Quais foram os passos que definiram sua metodologia de pesquisa?

NR: Inicialmente, imaginei que a pesquisa documental seria suficiente para levantar todos os dados. Nesse ponto, foi fundamental definir as unidades e subunidades de análises para delimitar a pesquisa. Talvez essa tarefa tenha sido a mais complexa da investigação, visto que o ambiente da comunicação científica se transforma a cada instante, impactando o cenário em volta da Ciência Aberta. Devido às dificuldades enfrentadas e à necessidade de mais informações das universidades, optou-se pelo envio de um formulário para alcançar dados que não foram possíveis levantar por meio da pesquisa documental. Ainda, outras técnicas e procedimentos metodológicos, que podem ser considerados mais periféricos para a pesquisa, também foram utilizados, como a análise altimétrica. Outro ponto importante foi a definição por um estudo multicaso ou comparativo. Apesar da pretensão inicial de observar todas as universidades federais brasileiras, por questão de exequibilidade, limitamos a uma amostra de 10% delas, sete no total. Selecionamos para participar as setes universidades melhores posicionadas no Webometrics Ranking of World Universities, The World University Ranking, Ranking Folha e no CWTS Leinder, em consulta realizada no primeiro semestre de 2021. Além disso, essas universidades deveriam estar com o seu Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) em vigência. Esse critério foi utilizado por considerar que esse documento pode ser entendido como uma das principais políticas institucionais, em função de registrar a missão, a visão, as metas e os indicadores de atuação das universidades por um período preestabelecido, possibilitando identificar se havia a previsão de atuação e de projetos voltados para práticas de Ciência Aberta. 

DC: Em termos percentuais, quanto teve de inspiração e de transpiração para fazer a tese?

NR: Difícil mensurar essa comparação. Contudo, como forma de transpiração, com perseverança e dedicação tudo se ajeita. De início, a maior dificuldade foi o deslocamento para participar das aulas presenciais, que aconteciam duas ou três vezes por semana, em determinado período do ano letivo. Minha residência é em Lavras, uma cidade do Sul de Minas Gerais, a 230 km de Belo Horizonte, local onde eram ministradas as aulas presenciais. Vencido o período de crédito e com o período pandêmico, a maior parte da pesquisa ocorreu remotamente. Por fim, buscava inspiração no desejo incessante de concluir o doutorado.

DC: Teria algum desabafo ou considerações a fazer em relação à caminhada até a defesa e o sucesso da tese?

NR: Embora tenha havido o acompanhamento da minha orientadora, em algumas situações, sentia-me só. Na pesquisa, existe a figura do orientador, contudo a pesquisa é desenvolvida pelo pós-graduando e a maioria das decisões são exclusiva do autor, com supervisão do orientador. E é nesse ponto que as incertezas e a insegurança podem se assentar.

DC: Como foi o relacionamento com a família durante o doutorado?

NR: O bom relacionamento com a família é importante para que tudo ocorra bem durante a pós-graduação. Além de amigos, pessoas especiais que conheci e alguns familiares, tive meu esposo sempre ao meu lado, apoiando e me motivando a seguir. Muitas vezes, ele me sequestrou do mundo científico e isso fez toda a diferença.

DC: Qual foi a maior dificuldade de sua tese? Por quê?

NR: Um dos desafios foi delimitar a pesquisa, as unidades e subunidades de análise e o outro, sem dúvida, foi desenvolvê-la durante o período pandêmico. Quando parti para a coleta de dados, por meio da pesquisa documental, identifiquei a falta de padrão de localização dos documentos nos sites das universidades. Percebi uma indexação precária da legislação interna das instituições e das notas comunicação e de divulgação da ciência, falta de preservação digital, com links não acessíveis ou incorretos, sistema de recuperação da informação das ferramentas dos sites institucionais inconsistente, falhas de recuperação, duplicação de resultados. É importante ressaltar que, durante a pesquisa, a maior parte dos servidores públicos federais passou a desenvolver suas atividades por meio do teletrabalho e, com o distanciamento pandêmico, novas formas de desenvolver atividades a distância surgiram e, devido ao excesso laboral, as pessoas pareceram bastante resistentes em estabelecer qualquer tipo de contato, mesmo telefônico.

DC: Que temas de mestrado citaria como pesquisas futuras possíveis  sobre sua tese?

NR: Ainda existem muitas lacunas envolvendo a Ciência Aberta e suas práticas, suas facetas. É um ambiente de pesquisa muito fértil e que precisa ser desenvolvido. Eu recomendaria mais pesquisa envolvendo a faceta de dados abertos, a avaliação da ciência por meio do uso de métricas mais responsáveis, os atores envolvidos com a Ciência Aberta, abordando questões de gênero e, em especial, a disputa que existe entre o conhecimento aberto e privado, a exploração do conhecimento aberto e as políticas públicas voltadas para esse tema.

DC: Quais suas pretensões profissionais agora que você se doutorou?

NR: Retomei as minhas atividades como bibliotecário-documentalista e pretendo dar seguimento ao canal de divulgação Ciência da Informação Express, atuando para dar mais visibilidade, melhorar e expandir a sua infraestrutura e analisar novos caminhos. Ainda, há mais dois outros produtos da tese que têm grande potencial de contribuição com a  Ciência Aberta, assim, acredito que divulgar esses recursos é uma das minhas pretensões. Outra proposição é tentar alguma oportunidade para desenvolver atividades voltadas para comunicação científica mais aberta na universidade do meu vínculo institucional ou em outra.

DC: O que faria diferente se tivesse a chance de ter começado sabendo o que sabe agora?

NR: Na minha opinião, a ansiedade é um dos grandes problemas da pós-graduação. Eu tentaria me controlar um pouco mais nesse ponto. Em muitas situações me sentia angustiado e, hoje, percebo que tudo fez parte de um grande processo de aprendizado.

DC: Como você avalia sua  produção científica durante o doutorado (projetos, artigos, trabalhos em eventos, participação em laboratórios e grupos de pesquisa)? Já publicou artigos ou trabalhos resultantes da pesquisa? Quais você aponta como os mais importantes?

NR: Uma das estratégias que tenho usado desde antes do doutorado é registrar e publicar qualquer tipo de experiência, trabalho ou mesmo uma opinião. Muitas vezes, pesquisamos algo e não encontramos referências simplesmente porque a pessoa que falou ou criou algo ou desenvolveu algum tipo de método ou solução não publicou ou não divulgou. Eu percebi que sempre tem alguém interessado no que você tem a dizer, por mais simples que seja. Assim, consegui publicar alguns artigos científicos com algum método adotado na tese ou experimentos testes. Alguns que foram publicados durante o doutorado são:

Além desses, há mais alguns que ainda estão em avaliação por periódicos nacionais. Assim, entendo que tive uma boa produção e de impacto razoável no doutorado. Espero que outras pessoas possam ser favorecidas com essas publicações  na condução de outras pesquisas.

DC: Exerceu alguma monitoria/estágio docência durante o doutorado? Como foi a experiência?

NR:  Não participei. Ministrei apenas algumas palestras sobre o tema da minha tese , mas, hoje, gostaria de ter participado do estágio docência.

DC: Elas contribuíram em sua tese? De que forma?

NR: Pelo fato de terem sido palestras sobre o tema da tese, posso dizer que houve contribuição.

DC: Agora que concluiu a tese, o que mais recomendaria a outros doutorandos e mestrandos que tomassem seu trabalho como ponto de partida?

NR: Que registrem tudo o que fizerem, que organizem seus dados e que busquem boas estratégias de publicação e adotem práticas de Ciência Aberta. Façam um plano de gestão de dados, publiquem em acesso aberto e não se escravizem por indicadores de avaliação descontextualizados. Atenção também com os periódicos predatórios, pois são um câncer da ciência.

DC: Como acha que deve ser a relação orientador-orientando?

NR: Entendo que deve ser o mais transparente possível. De forma particular, muitas vezes, queremos que a nossa pesquisa caminhe no nosso tempo. Esquecemos que os orientadores têm inúmeras outras atividades, orientandos, disciplinas para ministrar, compromissos administrativos e científicos e nem sempre é possível nos atender, exatamente, como gostaríamos. De certo, isso provoca certa angústia e ansiedade, mas é fundamental estabelecer uma relação de confiança e, de certa forma, estabelecer uma cumplicidade. Nos tornamos grandes amigos, conversamos sobre tudo durante a jornada do doutorado e só aumentou a minha admiração pelo trabalho dela como bibliotecária e como docente. Sou muito grato pela sua praticidade e pelas lições aprendidas com ela durante o doutorado.

DC: Sua tese gerou algum novo projeto de pesquisa? Quais suas perspectivas de estudo e pesquisa daqui em diante?

NR: A minha tese tem insight para diversas pesquisas, quando se pensa em avaliar instituições que desenvolvem pesquisa e políticas relacionadas à comunicação científica e à divulgação da ciência. Contudo não parei para planejar e projetar desdobramentos da pesquisa. 

DC: O que o Programa de Pós-graduação fez por você e o que você fez pelo Programa nesse período de doutorado?

NR: Entendo que houve muita troca. Enquanto foi possível, contribui com a organização de eventos e tentei ser o mais produtivo possível e o Programa de Pós-graduação e Gestão do Conhecimento (PPGGOC) me possibilitou adquirir e aprofundar conhecimentos para desenvolver a minha pesquisa e mesmo para o desenvolvimento das minhas atividades na minha instituição de vínculo. Além disso, foram estabelecidas muitas relações e ampliação da minha rede de contatos na área.

DC: Você por você: 

NR: Meu nome é Nivaldo! Mas, desde 2014, prefiro que me chamem de Calixto.  Isso representa uma mudança de perspectiva e gratidão aos meus pais adotivos por tudo que fizeram por mim. Graduei em Biblioteconomia na cidade de Formiga, por influência de amigos e de um trabalho que tinha em uma livraria da cidade. Posteriormente, trabalhei na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) e, em seguida, na Universidade Federal de Lavras (UFLA), onde atuo atualmente e tive a oportunidade de participar do doutoramento. A minha principal característica é a determinação e compromisso com tudo aquilo que me envolve, desde projetos simples aos mais complexos.  Conheço exatamente os meus limites e vivo uma luta diária tentando ultrapassá-los, sem, necessariamente, ser uma obsessão.

Consigo enxergar pontos positivos em todos os cantos e sou apaixonado por pessoas e por viagens.  Umas das coisas que mais gosto é de saber das histórias dos outros, de onde são, como são e como chegaram até determinado ponto.


Entrevistado: Nivaldo Calixto Ribeiro

Entrevista concedida em: 02 abr. 2023 aos Editores.

Formato de entrevista: Escrita 

Redação da Apresentação: Herta Maria de Açucena do Nascimento Soeiro

Fotografia: Nivaldo Calixto Ribeiro

Diagramação: Herta Maria de Açucena do Nascimento Soeiro

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