Entenda a importância do documento como fonte de informação no processo de justiça de transição
Entenda a importância do documento como fonte de informação no processo de justiça de transição
“Num país onde se é pouco abordado o direito à informação e à memória, governos democráticos sofrem constante instabilidade” afirma pesquisadora da Universidade Federal Fluminense
A autora Laís Nunes da Silva investiga qual é o papel do documento nos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade à luz do processo de justiça de transição. A pesquisa revela que o documento, tanto como informação quanto como dispositivo social, firmador de uma narrativa socialmente construída que possibilitam medidas reparatórias, preservação das memórias de vítimas e exercício do direito à memória e à verdade na sociedade.
Segundo a autora, se não fossem os documentos, boa parte dos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade não seria realizada; afetando, portanto, o processo de justiça de transição no Brasil.
Cada país tem seu próprio passado e lida com ele à sua maneira, e com suas próprias políticas de memória. O esclarecimento de fatos trabalha contra o esquecimento imposto em relação ao passado e age para a valorização da memória das vítimas para fortalecer o estado democrático de direito e a não repetição das violações contra os direitos humanos cometidas.
A Comissão da Verdade contempla vítimas de criminalidade e do abuso de poder, e atuam não só como dispositivos de busca pela verdade, mas como instrumentos de reparação às vítimas do Estado, por meio do respeito e garantia aos direitos humanos e à democracia, um dos mais importantes objetivos da justiça de transição.
O conjunto de medidas políticas e judiciais utilizadas como reparação das violações de direitos humanos, é um tipo de justiça específica, que tem como principal objetivo a valorização da memória das vítimas e formação da memória nacional de um país acerca de seu próprio passado. A justiça de transição busca investigar e punir crimes cometidos contra os direitos humanos, por meio de indenizações ou atos simbólicos, além de implantação de políticas públicas que visem reformas institucionais são procedimentos indispensáveis para a sua construção.
A pesquisa “Documento-Fonte: Justiça de Transição no Âmbito da Comissão Nacional da Verdade” revela que os documentos gerados após as comissões da verdade, como relatórios e dossiês, cumprem o papel de preservação da memória das vítimas e de todo um país no que diz respeito ao passado traumático da nação. Consequentes desses documentos promovem o exercício da lembrança de um específico período de nossa história, para que nunca mais se repita.
Questionada sobre a motivação da autora de pesquisar sobre o tema, Laís diz: “Num país onde se é pouco abordado o direito à informação e à memória, governos democráticos sofrem constante instabilidade. Elementos antidemocráticos podem emergir em governos eleitos democraticamente. O direito à informação e à memória são inerentes à sociedade civil como forma de conhecer o próprio passado, daí a importância do estabelecimento efetivo de uma justiça de transição no contexto brasileiro, em sua completude. O documento é um artifício para o alcance desses direitos.”
O dicionário Michaelis apresenta como definições o documento como: qualquer escrito ou impresso que fornece uma informação ou prova, usado para esclarecimento de algo e qualquer objeto, prova, testemunho, que possa servir de confirmação para conferir autenticidade a um fato histórico qualquer” ou seja, Qualquer elemento com valor documental, fotos, filmes, papéis, peças, fitas de gravações, construções, objetos de arte etc.
A pesquisa mostra que, no Brasil, os processos iniciaram tardiamente, e assim, priorizou o cumprimento da justiça reparatória, voltada para a busca da verdade, reparação financeira e simbólica e preservação da memória das vítimas, em detrimento da justiça processual e punitiva, na qual os violadores dos direitos humanos fossem investigados e punidos por suas condutas.
A dissertação apresenta os conceitos de justiça de transição e documento, levando em consideração seu funcionamento enquanto fonte de informação e um dispositivo social, e destaca a heterogeneidade e a subjetividade desses processos. “Embora existam discussões sobre os principais pressupostos do estabelecimento de uma justiça de transição plena justiça, busca pela verdade, reparação, reformas institucionais e reconciliação nem sempre todos são alcançados” pontuou Laís Nunes.
Para que isso ocorresse, seria necessária a modificação da interpretação da Lei de Anistia, que apresenta um caráter bilateral, prevendo o perdão a todos que cometeram crimes políticos ou conexos, inclusive sequestros, prisões indevidas, torturas e assassinatos cometidos pelo Estado durante o regime militar. Sendo assim, por meio da teoria neodocumentalista, foi possível compreender o documento enquanto um construto social, de peso histórico e cultural.
Acesse a tese em:
SILVA, Laís Nunes da. Documento-fonte: justiça de transição no âmbito da Comissão Nacional da Verdade. 2022 107 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Informação) – Programa de Pós-Graduação em Ciência da Informação, Instituto de Arte e Comunicação Social, Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2022. Disponível em: https://app.uff.br/riuff/handle/1/26851 . Acesso em: 24 jul. 2023.
Redação: Marcos Miranda
Revisão: Pedro Ivo Silveira Andretta
Diagramação: Marcos Leandro Freitas Hubner