Purpurina o ano todo: biblioteca escolar, mediação cultural e o calendário de celebração à diversidade, por Arthur Almeida e Hélio Pajeú
Purpurina o ano todo: biblioteca escolar, mediação cultural e o calendário de celebração à diversidade
Arthur Henrique Feijó de Almeida e Hélio Márcio Pajeú
arthuralmeidafeijo@gmail.com | helio.pajeu@ufpe.br
As bibliotecas escolares chegaram ao Brasil através dos Jesuítas – mais de 400 anos depois, esses espaços ainda passam por diversos desafios, que vão da infraestrutura precária, à sua gestão por profissionais que não são de Biblioteconomia. O público dessas bibliotecas, por se tratar majoritariamente de crianças, adolescentes e jovens, encontra-se em processo de formação, e esses espaços podem contribuir positivamente para a construção da personalidade e do caráter desses usuários. Ao contrário do senso comum, bibliotecas não devem perpetuar o estigma de serem lugares de silêncio, pensados apenas para a leitura. Bibliotecas escolares são espaços propícios à mediação cultural cujo objetivo maior deverá ser fornecer instrumentos para que a comunidade escolar seja capaz de trilhar seu próprio caminho social, cultural e educacional.
A mediação cultural não é apenas uma ponte entre as pessoas e a cultura. Essa ideia é errada porque sugere que a cultura é algo fixo e estático e que as pessoas não têm escolha no processo de se conectar com ela. Não é sobre forçar as pessoas a gostarem de uma cultura específica, mas sim dar a elas as ferramentas necessárias para decidir por si mesmas.
Na verdade, a mediação cultural é sobre criar as condições certas para que possamos tomar nossas próprias decisões sobre como se conectar com a cultura. A mediação cultural é sobre ajudar os sujeitos a entenderem e se envolverem com os elementos culturais que desejam, criando um ambiente propício para a troca de ideias e experiências.
Os formatos de mediação cultural são variados: saraus, exposições, debates, jogos, palestras, exibições de filmes, etc. Considerando as possibilidades que a mediação cultural traz para a biblioteca escolar, estes espaços podem e devem lutar por uma sociedade mais justa, igualitária e democrática. Os ambientes educacionais como escolas e universidades, por reproduzirem os valores socioeconômicos e culturais das classes dominantes, acabam por afastar desses espaços grupos historicamente oprimidos, como mulheres e sujeitos desviantes da norma heterossexual, isto é, a populção de lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais, pessoas queers, intersexuais, assexuais, panssexuais e outras designações de gênero e sexualidade (LGBTQIAP+). Ao perpetuar ideias como a de que ser heterossexual é normal e ser LGBTQIAP+ não, ou que homens devem buscar carreiras e mulheres devem cuidar da casa e da família, a escola reproduz uma violência de gênero que resulta em um alto índice de evasão escolar, casos clínicos de depressão, além de números alarmantes de violência física e sexual contra mulheres e pessoas LGBTQIAP+. Assim, as bibliotecas escolares precisam investir na mediação cultural para fomentar uma cultura de paz, diversidade e respeito.
O bibliotecário escolar é um profissional especializado em ajudar as pessoas a encontrar informações e descobrir coisas novas. Ele é chamado de infoeducador porque ensina as pessoas a usar e entender as informações. O trabalho dele não é só ajudar seus usuários a adquirir o gosto pela leitura, mas também ensiná-los a usar as ferramentas disponíveis para encontrar informações importantes. Ele é um mediador entre as pessoas e as informações, e isso é muito importante para que todos possam ser protagonistas da democracia.
Considerando esse cenário, o Núcleo de Estudos de Gênero (NEG), iniciativa da Secretaria da Mulher de Pernambuco em 2009, busca enfrentar esses problemas nas escolas da Secretaria Estadual de Educação de Pernambuco. Uma das escolas que possui um NEG é a Escola Técnica Estadual Almirante Soares Dutra (ETEASD), localizada na cidade do Recife.
Esse nosso artigo, publicado na Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documentação, surgiu de um trabalho de conclusão de curso pensado a partir do estágio na biblioteca da ETEASD.
Artigo de Hélio Pajeú e Arthur Almeida
A partir disso, elaborou-se em conjunto com a biblioteca e o NEG da ETEASD um calendário com atividades de mediação cultural para a discussão das questões relacionadas à gênero e sexualidade na biblioteca escolar:
Infograma de atividades proposto por Hélio Pajeú e Arthur Henrique Almeida.
Esse calendário busca contemplar todo o ano letivo – desconsiderando os meses de janeiro, julho e dezembro por causa dos recessos escolares – de forma que cada mês possua um assunto tema e dentro desse tema sejam elaboradas duas atividades. As atividades elaboradas servem como um norte para a atuação da biblioteca escolar nas discussões relativas à gênero e sexualidade com formatos que podem ser modificados e adaptados para cada um dos temas. Assim, esse calendário busca inspirar bibliotecários para o trabalho dessas temáticas de modo que sejamos capazes de transformar os números de violência de gênero em números de mulheres e pessoas LGBTQIAP+ premiadas, em melhores cargos, e em maiores níveis educacionais.
É vital para o bom funcionamento das atividades propostas pelo calendário que a biblioteca escolar esteja em sincronia com o restante da escola e não funcionando como uma instituição a parte, isolada das atividades realizadas em sala de aula e outros setores. Ainda que a presença de iniciativas como o NEG não seja realidade na maioria das escolas brasileiras, o bibliotecário infoeducador deve inserir-se nas atividades pedagógicas para auxiliar na execução das mesmas e fortalecer as atividades da própria biblioteca, envolvendo não apenas alunos e professores, mas todos os profissionais da instituição, pais e a comunidade do entorno da escola; pessoas que ecoarão os conhecimentos trazidos pela mediação cultural.
Acesse o artigo em:
PAJEÚ, H. M., & ALMEIDA, A. H. F. DE. Quando as questões de gênero invadem a biblioteca escolar: proposta de calendário comemorativo da diversidade. Revista Brasileira de Biblioteconomia e Documentação, São Paulo, v.17, p. 1–25, 2021. Disponível em: https://rbbd.febab.org.br/rbbd/article/view/1448 . Acesso em: 21 maio 2023
Sobre os autores
Arthur Henrique Feijó de Almeida
Mestre em Ciência da Informação e Bacharel em Biblioteconomia pela Universidade Federal de Pernambuco.
É professor Adjunto do Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal de Pernambuco. É membro do Grupo de Estudos dos Gêneros do Discurso (GEGe) e líder do Laboratório de Investigações Bakhtinianas Relacionadas à Informação e Cultura (LIBRI-CI).
Doutor e mestre em Linguística pela Universidade Federal de São Carlos e Bacharel em Biblioteconomia e Ciência da Informação pela Universidade Federal de São Carlos.
Redação: Arthur Henrique Feijó de Almeida e Hélio Márcio Pajeú
Foto: Arthur Henrique Feijó de Almeida
Diagramação: Pedro Ivo Silveira Andretta